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Marcelo Moreira


E o Brasil oficializa a sua “versão tropical” de uma excrescência chamada Creedence Clearwater Revisited, uma banda cover que repisa os hits do imenso Creedence Clearwater Revival – a primeira surgiu no começo dos anos 90 com dois integrantes da formação clássica da segunda, mas justamente os dois menos expressivos.
A banda Charlie Brown Jr assinou um contrato com a Sony nos últimos dias para eventuais lançamentos de material inédito ou de arquivo. Quem responde pelo legado da banda é Alexandre Abrão, o filho do vocalista Chorão, morto em 2013 e que era o dono e a alma da banda.
Que o contrato verse a respeito do material de arquivo e relançamentos até que faz sentido, mas para “futuros lançamentos”? Álbuns ao vivo com qual formação? Faz sentido existir Charlie Brown Jr sem Chorão e o multi-instrumentista Champignon, morto em 2015?
Se a banda já não era lá essas coisas com os principais músicos vivos, o que esperar então do grupo com músicos contratados e sem muita ligação com o passado e com o “estilo” da banda?
Segundo declarações recentes de Alexandre Abrão, havia a possibilidade de uma turnê em 2020 do grupo para homenagear Chorão, que completaria 50 anos de idade em 2021. Os shows, logicamente, foram cancelados por conta da pandemia de covid-19. 
Assim como na questão do Creedence, é algo extremamente arriscado mexer em hum legado poderoso, ainda que de qualidade questionável. Foram poucas as bandas brasileiras cantando em português que conseguiram tamanha e fiel base de fãs. 
Dar o nome de Charlie Brown Jr a uma banda cover apenas para “celebrar” uma efeméride e, de quebra, faturar bastante, não me parece algo muito sensato.
Ao lado de Skank e Jota Quest, Charlie Brown Jr foi uma das banda de rock que resistiram nas paradas de sucesso até a morte do cantor, segundo as listas de execução em rádios publicadas pela finada revista Billboard, versão brasileira, auditadas pela empresa Crowley.
Em um mercado dominado por sertanejos e, em alguma medida, por artistas de funk carioca e pagode, as bandas citadas, mesmo no fim das listas, eram a resistência do rock e do pop rock em um mercado degradado e dominado por artistas de baixa qualidade. Ponto máximo para o Charlie Brown 
Jr.

Mesmo em processo de decadência, com alta rotatividade na formação e nos constantes barracos e polêmicas que envolviam a banda, Chorão, até a sua morte, conseguia manter a cabeça acima da água no pântano lamacento que se tornou o pop rock nacional.

Musicalmente, Charlie Brown Jr tinha um apelo fenomenal entre uma parcela expressiva de adolescentes e jovens que se consideravam deslocados em uma sociedade consumista e individualista. As letras eram fracas e simplórias até, mas as melodias chegavam a ser cativantes, em alguns momentos, misturando batidas de hardcore, punk e um pop mais acessível.

Havia uma aposta entre alguns críticos musicais a respeito do suposto legado que Chorão e sua banda deixariam. Houve quem apostasse no zero, na lenta dissolução do mito Charlie Brown Jr, assim como o tal do movimento emo esfarelou. 
A constatação do engano veio muito mais rápido do que se supunha, nem tanto pelos poucos méritos artísticos do quinteto, mas pela absoluta terra arrasada em que o pop rock nacional se assentou. 

Diante da mesmice, da franca decadência do rock nacional, em todos os sentidos, da falta de perspectivas e da falta de inspiração, Charlie Brown Jr ganha relevância que talvez não teria em outras circunstâncias.

Aliás, é das pouquíssimas bandas a ter algum tipo de relevância a partir de 2005, para desespero de quem apostava no contrário, e de quem gosta de boa música em si. Quem diria que sentiríamos falta do Charlie Brown Jr?