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Marcelo Moreira



Bandas ruins estavam fazendo muito sucesso e ganhando dinheiro, e aquele quarteto de Pasadena, na Califórnia, muito melhor do que todos eles, ainda tocava em festas de quintais de vizinhos. A idade ia passando, eles já tinham passado dos 20 anos de idade, e começavam a desanimar. 

Decidiram pela enésima vez continuar por mais um tempo para ver as coisas acontecerem. “Não é possível que seremos recusados mais uma vez”, disse o guitarrista astro amado por todos os músicos de Los Angeles. 

E então encontraram um hippie doidão que entendia muito de música chamado Ted Templeman. Um ano depois lançavam aquele que seria, até então o disco de estreia mais importante e vendido do rock.

Em maio de 1978, “Van Halen”, o primeiro álbum, subia como um foguete nas paradas de sucesso e sumia das lojas contra todos os prognósticos, inclusive os da gravadora da banda, a Warner. O mundo descobriu um guitarrista genial holandês chamado Edward Van Halen, que viria a ser considerado o guitarrista mais influente do rock depois de Jimi Hendrix. 

“Van Halen”, que entre os fãs virou “Van Halen 1”, trazia os elementos que fizeram do quarteto os reis do underground pesado da Califórnia: músicas atraentes, alegres e pesadas, como inovação nas guitarras e letras engraçadas, zombeteiras e ensolaradas.

E a banda dos quintais e dos clubes fedorentos recusada por todas as gravadoras se tornou a “salvação” do heavy metal, como bem definiu o professor e escritor Greg Renoff, no livro “A Ascensão do Van Halen”, lançado em 2016 e que ganhou recentemente uma versão brasileira da Editora Madras. 

Para quem gosta do Van Halen, de história do rock ou mesmo de um bom livro sobre músicos, a obra de Renof é altamente recomendável. O autor, que é muito fã da banda (o que, às vezes, se torna um defeito ao longo da narrativa), faz uma biografia do grupo desde o começo até o fim de 1978, quando fica gigante na turnê mundial do álbum de estreia.

Bastante didático e muito rico em fontes entrevistadas, o livro traça um detalhado panorama de como o Van Halen caminhou a duras penas para conseguir o estrelato – de como, sem muitas firulas, se consolidou a determinação dos músicos, que desanimavam às vezes, mas que tinham convicção de que seriam grandes. 

O mais legal é que dá pistas de como surgiram os problemas futuros, anos depois, que culminaram na saída do vocalista David Lee Roth em 1984, após seis álbuns de estúdio, vendas gigantescas e turnês monstruosas (com direito a uma passagem pelo Brasil em 1983).

“Van Halen” é um assombro pela proposta ousada de buscar timbres inusitados e, por que não, inéditos de guitarra e o baixo propulsor que ressaltava ritmo e melodia quase que ao mesmo tempo, algo que gente só graúda do instrumento fazia, como John Entwistle (The Who) e Jack Bruce (Cream), por exemplo. 

A produção de Templeman valorizava o conjunto e o peso característico da banda, de forma lapidada, mas não o suficiente para que soasse pomposo ou artificial. 

No livro, Renoff conta alguns dos então segredos, à época, dos timbres maravilhosos de guitarra de Eddie, como a bomba propulsora e o “cabeçote” inventado por ele para conseguir mais potência e força no som sem ter de aumentar o volume do amplificador.

E aí temos pérolas roqueiras como “Runnin’ With the Devil”, que abre o álbum com hard rock intenso e delicioso iniciado por um buzinaço. E o quer dizer da fantástica “Ain’t Talkin’ “Bout Love”, um rock veloz e furioso, mas com um groove inexplicável. 

Estão lá “Eruption”, a peça instrumental que se tornou a obsessão de todos os guitarristas roqueiros do mundo, a pesada “Ice Cream Man” e a sarcástica e sacana “Jamie’s Cryin”‘. 

Tem também os hits certeiros como “Little Dreamer” e “I’m the One”, e a peça que catapultou a banda para o sucesso imediato, a versão incendiária e deslumbrante de um megassucesso mundial, “You Really Got Me”, clássico dos Kinks.

É nessa faixa que a bateria demolidora de Alex Van Halen e o baixo propulsor de Michael Anthony praticamente definem o som da banda, construindo uma bela parede sonora para as aventuras orbitais de Eddie. 

O disco de estreia do quarteto não apenas salvou o heavy metal, como diz Renoff, como também elevou muito os padrões de produção e os patamares instrumentais da guitarra. Demorou, mas a banda de quintais californiana mudou o mundo da música.