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Nervosa em 2020: da esq. para a dir., Prika Amaral, Mia Wallace, Diva Satanica e Eleni Nota (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Era só uma questão de tempo para que a última remanescente estrangeira da revolução da banda Nervosa anunciasse a sua saída. E foi o que aconteceu neste sábado de Carnaval. A baixista italiana Mia Wallace não é mais uma integrante oficial e tocará como “convidada quando quiser”.

A musicista praticamente não tocava com a banda desde o primeiro semestre de 2022, quando teve de se ausentar devido a “problemas familiares”. Depois disso fez alguns shows, mas novamente ficou de fora da tão esperada turnê latino-americana, que passou pelo Brasil, sendo substituía pela grega Helena Kottina.

Com as várias mudanças ocorridas na banda a partir de novembro do ano passado, imaginava-se que Mia pudesse deixar o grupo em razão dos problemas familiares que ainda persistem. Esse foi o motivo alegado comunicado oficial publicado nas reds sociais e também no texto pessoal da guitarrista brasileira Prika Amaral, a líder do grupo.

Ao contrário das outras defecções, Prika escreveu um texto bastante carinhoso para falar da “saída” da amiga, chamando-a ao menos três vezes de “irmã”. Explicou que os problemas que impedia Mia de encarar turnês persistiam e que a baixista não mais se dedicaria integralmente ao grupo.

A guitarrista, no entanto, “descartou” o afastamento total da italiana da banda. “A Nervosa agora terá duas baixistas, sendo que a minha irmã Mia será uma convidada de honra, tocando com a gente quando puder e quiser”, escreveu a musicista brasileira.

Por sua vez, Mia Wallace comunicou a saída em inglês, nas redes sociais, em termos bastante amenos e, aparentemente, sem entreveros. Falou em deixar portas abertas, assim como o texto de Prika, e ressaltou o quanto a decisão foi difícil de tomar, exalando sinceridade, bem diferente dos comunicados duros e secos que outras ex-integrantes adotaram.

A Nervosa surgiu em São Paulo por volta de 2010 por iniciativa de Prika. Era para ser uma banda de metal extremo formada por mulheres. Com a chegada da baixista e vocalista Fernanda Lira, em 2011, a banda engrenou, tendo como baterista Fernanda terra.

Por mais de dez anos Prika e Fernanda levaram o trio com dificuldade e garra, gravando três álbuns e um EP. Fernanda Terra saiu em 2015 foi substituída por Pitchu Ferraz, que gravou o disco “Agony” e fez uma turnê mundial, mas não durou muito tempo. Em 2018, a gaúcha Luana Dametto assumiu as baquetas.

Era a melhor formação do trio, que desde então estava em plena ascensão, chegando a ser uma das sensações do Rock in Rio 2019 e deveriam se apresentar no festival alemão Wacken Open Air de 2020, mas a pandemia mundial de covid-19 estragou os planos. O mundo parou, tudo foi cancelado e a Nervosa implodiu, em meados de 2020, antecipando algo que certamente ocorreria depois do Wacken.

Sem especificar que tipo d problemas de relacionamento ocorreram, Fernanda e Luana anunciaram no mesmo dia que estavam saindo da Nervosa e tornando oficial o que era um projeto paralelo, a Crypta, orientado para o death metal. Claro que o rompimento não foi uma coisa simples e “numa boa”, mas ambas as partes conduziram tudo de forma civilizada, sem críticas mútuas ou “lavagem de roupa suja”.

menos de dois meses depois da separação, Ptika surpreendeu ao anunciar as novas integrantes, transformando a Nervosa em quarteto e uma formação internacional: a espanhola Diva Satanica nos vocais 9também da banda Bloodhunter), a baixista italiana Mia Wallace e a baterista grega Eleni Nota.

Apesar da pressa, com uma gravação relâmpago, lançaram o álbum “Perpetual Chaos em janeiro de 2020, com produção do espanhol Martin Furia, hoje guitarrista da banda alemã de thrash metal Destruction.

As coisas deram certo por um ano, em meio a extensas e cansativas turnês mundiais e a Nervosa manteve o prestigio conquistado com a formação anterior e era considerada uma banda em ascensão no cenário extremo internacional, mas os problemas começaram quando Eleni Nota descobriu uma série de problemas de saúde que a afastaram dos palcos no começo de 2022.

Ela foi substituída temporariamente pela argentina Nanu Villalba. Logo em seguida foi a vez de Mia se ausentar por conta de problemas familiares. Foi aí que chegou a guitarrista grega Helena Kottina para assumir temporariamente o baixo.

Apesar das substituições, a Nervosa manteve o nível das apresentações e o prestígio não foi arranhado, mas em novembro passado houve uma sucessão de notícias desagradáveis.

A banda anunciou de forma sucinta e sem maiores explicações que Nanu, que tinha sido efetivada após o anúncio da saída definitiva de Eleni em agosto, estava deixando a banda. A argentina escreve nas redes sociais, de forma ressentida, que não poderia explicar detalhadamente os motivos de sua saída “por “questões contratuais”, insinuando que não saiu de forma amigável.

Em janeiro de 2023, foi a vez de Diva Satanica sair. O comunicado oficial dizia apenas que a espanhola tinha avisado em setembro que não continuaria e que nem participaria das gravações do novo disco, que começariam em novembro.

O mesmo texto informava que Helena Kottina tinha entrado na banda, mas como segunda guitarrista e confirmando a permanência de Mia Wallace. Dias depois, em entrevista ao programa Kazagastão, de Gastão Moreira, ela contou que já compunha com Helena desde mao de 2022, que era uma “parceira importante” no atual esquema de trabalho da Nervosa.

Curiosamente, manteve segredo a respeito dos nomes das novas vocalista e baterista, mas confirmou que a banda se transformara em um quinteto. De forma bem humorada, reclamou da fama de “pessoa difícil” para trabalhar por conta das várias mudanças na Nervosa.

“As pessoas não sabem o quanto é difícil manter uma banda underground na ativa, ainda que bem-sucedida internacionalmente”, explicou a guitarrista brasileira. “Em muitos aspectos, é como uma empresa, em que as pessoas interagem, discute adoecem, cansam e pedem demissão, têm problemas diversos. Nem sempre as coisas dão certo todos os dias.”

Por mais que Prika Amaral tente normalizar as mudanças que a banda Nervosa registrou desde o meio de 2020, não dá para considerar normal a quantidade trocas quando se trata de um nome forte no cenário internacional e que continua em ascensão apesar das dificuldades.

A banda Nervosa conseguiu muita coisa em menos de 15 anos de trajetória – e muito mais depois das mudanças drásticas de 2020. Mesmo com pandemia e alterações mundiais na forma de se trabalhar com música, o grupo conseguiu se manter o prestígio, ficando em pé e demonstrado certa força.

Prika precisará reconstruir totalmente a Nervosa pela segunda vez e quase do zero, correndo o risco de ver as críticas de ser uma pessoa difícil se avolumarem de novo. Infelizmente, as comparações, guardadas as devidas proporções, com a fase ruim do Guns N’ Roses só com Axl Rose como membro clássico único – e chefão poderoso – serão inevitáveis. E, infelizmente, sobram dúvidas a respeito de a Nervosa ter fôlego, mais uma vez, para renascer.