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Eric Gales incendeia o Rio das Ostras Festival (FOTO: EUGENIO MARTINS JUNIOR)

Eugenio Martins Junior – do blog Mannish Blog

Quando comecei a cobrir esse festival, em 2007, todos os envolvidos ficavam no mesmo lugar, o Hotel Vilarejo. Músicos, produção e jornalistas se trombavam nos corredores, no café da manhã e na piscina. Era fácil conseguir as entrevistas. “Olha ali o Mike Stern”. Pô, vou cercar o Maurício Einhorn depois do café”. “Cara, o Duke Robillard tá tomando um solzinho”.

 Com o fechamento do hotel todo mundo ficou espalhado pela cidade e as entrevistas individuais ficaram muito mais difíceis de se conseguir. Você tem de correr atrás e muitas vezes abdicar de algum show.

Ontem o plano era conversar com o Eric Gales. A passagem de som no palco Costazul era as 13h30, na mesma hora do show do Roosevelt Collier no palco da Lagoa. Então sentei lá e fiquei esperando a passagem de som que atrasou por problemas técnicos.

Quando finalmente consegui ficar cara a cara com o malandro ele dispara: “Ten minutes”. Isso porque eu ainda o presenteei com fotos ampliadas de um show que fizemos em Santos há 15 anos. Mas, fazer o quê? Artista é assim. Mas já havia dado sorte de manhã, Alex Malheiros, baixista do Azymuth, estava hospedado na mesma pousada que eu e consegui falar com ele após o café da manhã. 

Saí da entrevista com o Eric e fui direto para a Lagoa do Iriry, onde aconteceria a apresentação dos irmãos Simi com o Keith Dunn. Foi a mesma coisa da noite anterior, blues tradicional na veia, só que agora mais perto do público. Junto com a cozinha da banda, Pedro Leo (bateria) e Wellington Paganno (baixo), Dunn fez a plateia dançar de verdade.Saí dali e na volta pra casa resolvi passar no palco da Costazul e ver a passagem de som do Jon Cleary.

 Por mim, um dos shows mais esperados desse festival. Assisti o finalzinho da passagem e na hora que ele estava descendo a escada pedi uma entrevista pra depois e ele manda: “Right now, no problem”. Saquei o gravador e fizemos ali na hora. Aprende Eric Gales.

Então, nada mal. Em um fiz três entrevistas. Em breve posto todas aqui no Mannish Blog. A gripe me pegou. Achei que não ia conseguir levantar da cama pra ver os shows da noite. Mas os deuses do blues me pegaram pela mão e me levaram. Eles nunca falham, nas piores horas o blues vai ser o teu suporte. Pode acreditar.

Cheguei na metade pro fim do show do Nico Rezende Jazz Quinteto – Tributo a Chet Baker. Um show competentíssimo com Nico recriando ao piano os temas do ícone maldito do cool jazz. Let’s Get Lost, My Funny Valentine estavam lá.

Não consegui identificar o último tema, porque estava com a cabeça zoada. Quase vomitei. Tive de sentar, tomar uma água e ficar quieto um tempo. Tava mal.Quando Delvon Lamarr subiu ao palco eu ainda estava estranho.

A cabeça girava e doía. Talvez por isso o show que tanto esperava não aconteceu. Pra mim foi muita punheta em cima do palco. Uma banda com apenas três caras mandando ver nos instrumentos não me empolgou tanto quanto as audições que ouço no fone.

Ok, podem me chamar de mané. Ou talvez tivesse elevado a minha espectativa. Vejam bem, os caras levantaram a galera que pulou do começo ao fim. Quando tocaram Move On Up e Jimmy’s Groove o crowd enlouqueceu.

O público estava feliz, a direção do festival estava feliz. Então, quem sou eu pra despejar o meu azedume nas intenções da galera. Delvon Lamarr é super carísmatico e o guitarrista Jimmy James nem se fala. E apesar de ter um metro e meio e pesar 12 quilos o baterista David McGraw bate bem. Então foi um show que assisti meia hora e fui me sentar.

Os próximos seriam os shows que eu realmente fui pra ver: Jon Cleary e Eric Gales. Jon subiu ao palco despretensiosamente. Um cara que nasceu na Inglaterra e foi morar sozinho em New Orleans com apenas 17 anos e se tornou um dos principais pianistas na cidade dos pianistas. 

Bastaram apenas três caras, Cleary (piano e teclado), Derwin “Big D” Perkins (baixo) e AJ Hall (bateria) para fazer aquele som massa de New Orleans, com todos aqueles molhos e sabores que a cidade oferece. Um show extremamente dançante e ao mesmo tempo instrutivo. Explico.

Em apenas uma hora, Cleary contou histórias de amores pessoais, amores desfeitos e, principalmente, amor à cidade que escolheu para morar nos últimos 40 anos. Histórias de amor e glória. De perdas e reconquistas da cidade mais bacana dos Estados Unidos. Mais negra, mais francesa e mais índia. Centrado em Dyna-Mite, seu mais recente disco, foi um show pra lavar a alma. A dor de cabeça passou.

Quando o Eric subiu ao palco ainda estava meio puto por causa daquela história dos “ten minutes”. Porra! Mas quando o guitarrista de Memphis atacou a sua Magneto Eric Gales Signature dourada, vestido com um paletó dourado, cheio de colares dourados, a noite virou ouro.

 Produzi um show do Eric Gales em Santos há 15 anos que foi sensacional. Quem estava naquela noite lembra desse show até hoje. Mas posso garantir, aquele show não chegou a uma pequena fração do que foi o show de ontem. 

Foi um choque, no bom sentido, poder ver que o Eric se transformou nesse grande artista. Um nível superior no mundo da música, ao lado de BB King, Buddy Guy, Carlos Santana, Jimi Hendrix e tantos outros ícones da guitarra mundial. O show foi todo baseado em seu mais recente trabalho, o excelente The Bookends. E Ainda tocou o single lançado há três semanas, “I Want My Crown”. 

O que eu vi ontem foi um artista preocupado com todos os detalhes de uma apresentação. Dominou completamente a platEia desde o primeiro instante que pisou no terreiro. Não sei porque me veio a imagem de Ogum, o Deus da guerra e do fogo. Provocando o público a toda hora. Seus arranjos nunca vão pelo caminho mais fácil. Com aquela técnica não podiar ser diferente.

A banda vai na fé junto com ele, Smoke Face (baixo), Benjamin (teclado), Nick (bateria) e LaDonna Gales (percussão).É importante dizer que LaDonna é também responsável por resgatar Eric Gales de um porão onde ele mesmo se trancou e jogou a chave fora por anos. Ele faz questão de dizer isso por onde passa.

Se hoje Gales se tornou um dos maiores artistas do mundo, pesou a mão de LaDonna. E no final rolou até Um FORA BOLSONARO espontâneo na plateia.