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Marcelo Moreira

A avalanche de notícias ruins diárias sobre a decadência acelerada de nossa sociedade não dá trégua para que possamos prestar a atenção a algumas boiadas que passam sem que percebamos.

O mais novo atentado perpetrado contra a liberdade de expressão foi a imposição de “um acordo” para que professores universitários não sejam processados por terem criticado publicamente o nefasto presidente da República.

Dois deles, ex-reitores das Universidade Federais de Pernambuco e Pelotas (RS) foram duríssimos ao detectar ilegalidades, incompetências e desvios de posturas de Jair Bolsonaro nas escolhas de novos reitores e na condução criminosa e deliberadamente leniente no combate à pandemia de covid-19.

Alegando tecnicidades e questiúnculas regimentais, a Controladoria Geral da União (CGU) ameaçou os professores de processo por “imoralidade administrativa” – criticaram o presidente em “ambiente de trabalho” – dentro das universidades – e usando “veículos da universidades” – redes sociais oficiais das instituições.

Os dois professores e ex-reitores preferiram assinar um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) para encerrar o processo e, teoricamente, se comprometendo a não criticar o presidente nefasto por dois anos em ambientes públicos e de universidades. Argumentaram que seria mais interessante e menos problemático do que ter de encarar o processo e atrair mais ira governamental.

Pandemia? Onde? Chega de mimimi, gente! Jair Bolsonaro se diverte inaugurando uma obra qualquer em Pernambuco (FOTO: ALAN SANTOS/PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA-19.FEV.2021)

O episódio reacendeu a chama fascista de apoiadores de bolsonada a respeito das investidas prometidas contra críticos do presidente por parte de risíveis advogados encastelados na não menos ridícula OACB (Ordem dos Advogados Conservadores do Brasil), grupelho esdrúxulo surgido na Paraíba.

Inflamados por esses dois episódios, surgiram nas redes sociais celerados prontos para servir como delatores e dedos-duros, como perfeitos sabujos e lacaios de regimes autoritários. Entre os alvos, alguns artistas que não aliviam para bolsonada.

Claro que Tico Santa Cruz, o vocalista da banda Detonautas Roque Clube, estaria nesta “lista de detratores”, mas chama a atenção a ira de bolsonaristas com o vídeo da música “Tonight’s Riot”, da banda XEI & Sons in Black.

Alexei Leão, vocalista da banda de metal Stormental, atualmente mora em Portugal, mas mantém ativo o projeto paralelo que gravou “Tonight’s Riot”, em clipe que critica pesadamente, nas imagens do desenho animado, Bolsonaro e Donald Trump, ex-presidente dos Estados Unidos. os dois são ridicularizados, enquanto a letra faz uma crítica mais genérica.

O mundo fascista que apoia Bolsonaro ficou enraivecido e são várias as “promessas” de processo contra o cantor por conta dos ataques ao presidente. As alegações são as mais estapafúrdias, do mesmo naipe ridículo dos argumentos da CGU contra os professores e das intimidações dos piadistas da Paraíba.

Só que convém não subestimar a Justiça brasileira, célebre por acolher causas aparentemente sem sentido, especialmente se houver menção a autoridades do mundo conservador, em interpretações muito particulares do que vem a ser a liberdade de expressão no Brasil. 

E assim caminhamos para enfrentar os ataques diários dos bárbaros contra a civilização. Não desprezemos o potencial de aborrecimentos que esses seres inomináveis podem causar, por mais que não existam argumentos para qualquer tipo de ação judicial. Sempre há um plantonista no Judiciário que ter uma visão im pouco mais “ortodoxa” das leis que regulam o direito de se expressar.

A prisão do deputado bolsonarista criminoso e espalhador de fake news Daniel Silveira (PSL-RJ) não só não ajudou a amenizar a questão como acirrou os ânimos, seja contra o STF (Supremo Tribunal Federal), seja de magistrados conservadores que não engoliram a detenção do parlamentar.

Seria muita insanidade imaginar que o mundo fascista que orbita em torno de Bolsonaro orquestrasse judicialmente “retaliações” por conta da prisão de Silveira. 

No entanto, de forma prudente, é melhor não desprezar nenhuma hipótese, por mais estapafúrdia que seja. Afinal, os tecnicismos de regimentos internos obscuros intimidaram de tal forma professores universitários que estes preferiram se submeter a um acordo asqueroso para encerrar as ameaças de processo.

Com o desespero do governo fracassado e a pressão constante de uma sociedade cada vez mais emparedada pela incompetência federal – sem contar os mais de 260 mil mortos (e crescendo) por causa da pandemia -, o bolsonarismo fascista vai subir o tom e as apostas. Vai esgarçar os limites constitucionais e insistir em ofensivas judiciais para intimidar críticos e detratores.

A burrice e a ignorância que dominam o bolsonarismo fascista são tão estarrecedores que ensejam uma campanha imediata de protesto que descambe para pedidos múltiplos de impeachment, por mais que isso abalroe e enfraqueça a combalida democracia brasileira. É muito melhor do que continuar engolindo e relevando dos constantes ataques constucionis dessa turma de celerados.