Escolha uma Página

Não é comum, mas o jazz pode ser bem pesado. Os baixistas Stanley Clarke e Stu Hamm são exemplos de como é possível fazer música melodiosa e agressiva usando o ritmo como base – algo que mestres como Ron Carter e Billy Cobham já tinha ousado fazer bem antes.

Quando Felipe Andreoli anunciou o financiamento coletivo para gravar e lançar “Resonance”, sua estreia solo, muitas perguntas surgiram. A principal delas: como o baixista do Angra faria para que seu instrumento ficasse em evidência em um disco de heavy metal? Como conseguiria equilibrar o baixo caudaloso e gordo com a predominância das guitarras?

A primeira providência foi simples: não fazer um disco de heavy metal. A segunda foi mergulhar no jazz e no rock progressivo. E eis que temos um dos melhores discos instrumentais já feitos no Brasil, com uma mistura maravilhosa de jazz, blues, metal, rock progressivo e música instrumental brasileira.

Com a desvantagem de não tocar um instrumento que deixa evidente o virtuosismo a técnica extrema, Andreoli acertou ao mostrar que a habilidade é fundamental para deixar o baixo em evidência sem que se transforme em um mero exercício de exibição. E dá-lhe as toneladas de lições de Stanley Clarke e Charlie Mingus.

“A liberdade artística de ser independente me deu condições de gastar o tempo que fosse necessário até que o álbum estivesse exatamente como eu idealizei. E agora está chegando a hora de mostrar ‘Resonance’ a vocês e ao mundo”, declarou o músico.

Para quem acompanha o fascinante mundo da música instrumental dentro do rock, “Resonance” tem influências claras do mundo do metal progressivo, mas também envolve uma série de ecos de instrumentistas com largas passagens no jazz, como Tony Levin (King Crimson) e John McLaughlin (Mahavishnu Orchestra).

Não é coincidência que arranjos e baixo e guitarra se assemelhem ao que foi gravado nos últimos trabalhos de John Petrucci (guitarrista do Dream Theater) e do Liquid Tension Experiment, que tem Levin e Petrucci na formação, além do baterista Mike Portnoy (ex-Dream Theater).

Com credenciais tão robustas, o baixo proeminente domina a cena. “Driven”, a canção que abre o álbum, é contundente e transforma Andreoli em um regente e em um ás do baixo ao mesmo tempo, assim como na faixa-título. A guitarra conduz a melodia, mas é o baixo que preenche tudo e dá o tom das músicas. Andreoli sola com maestria e passeia pelas notas com inteligência a versatilidade.

O lançamento de Resonance será a realização de um antigo sonho de Felipe Andreoli: “Depois de anos dedicados a diversos projetos, chegou o momento de me voltar totalmente a um trabalho com a minha assinatura. Resonance mostra quem é o Felipe como artista, compositor, baixista e produtor”. 

Uma canção aparece duas vezes no disco: “Thorn in Your Side”, com vocais e em modo instrumental. Os vocais ficaram a cargo do croata Dino Jelusick, cantor fartamente elogiado por gente como Dave Coverdale. É um hard rock moderno, bem diferente do power metal progressivo do Angra. Na bateria, ninguém menos do que Simon Phillips, inglês veterano que já tocou com Judas Priest, The Who e mais um mont de gente de primeiro calibre.

Felipe Andreoli (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Uma pitada de Angra dá as caras na canção “Sagan”, com a participação do amigo e antigo colega Kiko Loureiro, hoje guitarrista do Megadeth. É uma gentileza pela contribuição de Andreoli em sue mais recente disco solo. Loureiro empresta sua genialidade em um solos incandescentes e uma condução melódica admirável, enquanto o baixo de seis cordas começa a duelar com a guitarra para desaguar em um jazz pesado e recheado de ousadia.

Felipe Andreoli também se sai muito bem fora da zona de conforto em composições que, aparentemente, foram feitas para os convidados especiais. “Metaverse” tem na bateria o mito da bateria Virgil Donati, que imprime andamentos diferentes e impactantes, enquanto o baixo o assume o comando de tudo.

“Down the Line” traz o guitarrista Guthrie Govan (The Aristocrats), um craque no jazz e no rock instrumental que colocou um molho bacana digno de um Joe Pass ou John Scofield em uma música recheada de boas ideia e passagens intrincadas.

“Resonance” e um trabalho extraordinário que surge das trevas da pandemia de covid-19, um período tenebroso da história da humanidade em que muita reflexão foi necessária para suportar muitos dias de inatividade e clausura. Trabalhos como esse são fundamentais para mostrar o quanto a música e a arte são fundamentais.

Quem são os convidados estrelados

Os primeiros convidados especiais de “Resonance” foram divulgados por Felipe Andreoli. O baterista australiano Virgil Donati é um dos mais conceituados do mundo, reconhecido por sua velocidade e avançadas habilidades técnicas. Trabalhou com o Planet X (ao lado de Derek Sherinian), Steve Vai, Frank Gambale, Scott Henderson, Steve Walsh, Mick Jagger, Joss Stone, entre muitos outros. 
Donati foi um dos sete bateristas testados pelo Dream Theater para a vaga de Mike Portnoy, em 2011, sendo um dos grandes destaques das audições.

Também da Austrália, Brett Garsed é músico e compositor, e ficou conhecido por integrar a banda de Prog metal instrumental Planet X e o grupo solo de Virgil Donati, além de trabalhar como guitarrista com John Farnham e T. J. Helmerich. O músico integrou o grupo americano de glam rock Nelson, com o qual gravou o grande sucesso comercial After the Rain. Foi músico da banda solo de Paul Stanley (Kiss) na turnê do aclamado Live to Win, em 2011.

O britânico Simon Phillips é outro monstro da bateria, com um extenso currículo, com bandas lendárias como o Asia, Judas Priest, Toto, The Who e artistas como Michael Schenker, Jack Bruce, Jeff Beck, Joe Satriani, Jon Anderson, Gary Moore e Steve Lukather. Ganhou diversos prêmios durante sua carreira, incluindo indicações ao Grammy.

Por último, Guthrie Govan, guitarrista inglês de 49 anos, ganhou fama mundial ao integrar o Asia entre 2001 e 2006. O virtuoso instrumentista passeia por diversos estilos, como o jazz fusion, progressivo, metal, eletrônica, blues rock, funk, country, entre tantos outros. Começou carreira solo logo após sair do Asia, e em 2016, gravou um álbum com o projeto Ayreon.