Escolha uma Página

Três vozes poderosas em projetos interessantes aparecem com destaque no rock europeu deste segundo semestre. São mulheres que mostram trabalhos maduros e consistentes fora de suas bandas principais, indicando caminhos promissores.

As finlandesas Netta Laurenne e Noora Louhimo e a polonesa Marta Gabriel são as musas do metal da atualidade e já rivalizam com as consagradas Cristina Scabbia (Lacuna Coil), italiana que se tornou ícone da música pesada, e Alissa White-Gluz (Arch Enemy), a canadense que se tornou a voz estrondosa do Arch Enemy.

Noora Louhimo surpreendeu os fãs da banda Battle Beast em sua primeira iniciativa solo durante a pandemia. Abraçando um hard rock de viés americanizado, a loura brilhou com o seu Noora Louhimo Experience no álbum “Eternal Wheel of Time and Space”.

O power metal de sua banda principal dá lugar aqui a um hard rock encharcado de blues e o acerto é total. Sua voz ganha muito destaque sem as pesadas camadas de guitarras e teclados do Battle Beast e a moça tem mais espaço para interpretar. 

A faixa-título é um primor de feeling, com seus violões em harmonia e criando um clima bem gostoso de southern rock, completamente diferente da gélida Finlândia e do som duro e marcial do Battle Beast. Noora brinca com a voz, indo do suave ao grito primal com muita facilidade.

O clima psicodélico sessentista permeia todo o disco e torna bem agradável a audição de canções simples como “Piece of Your Love” e “Urban Life”. “Coda” mergulha um pouco no rock progressivo para descambar em um hard bem feito e energético. 

É bem surpreendente ouvir algo bom e, ao mesmo tempo, despretensioso, com doses inteligentes de várias influências. O que menos existe aqui é o metal estridente e intenso da Battle Beast.

Noora Louhimo também protagoniza outro trabalho interessante lançado na pandemia. Em “The Reckoning”, ela junta forças com uma rival e compatriota, ao menos na música: Netta Laurenne, da banda de metal Smackbound.

Laurenne-Louhimo é o nome do projeto inventado pela gravadora italiana Frontiers, uma das grandes incentivadoras do hard rock e do classic rock no mundo depredado pelo fim das gravadoras como as conhecemos.

Durante a divulgação do CD, Laurenne mostrou uma empolgação com o trabalho em dupla: “Com este álbum, eu quis capturar a essência do heavy metal clássico e hard rock e combiná-la com ótimas melodias e letras que têm valor. Ficou claro desde o início, tendo duas vozes fortes no álbum, que isso álbum ia ser cheio de poder, energia, atitude e emoção.”

Noora Louhimo (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Segundo ela, é um lado porrada que precisava ser libertado. “Eu o imaginei chutando amorosamente a bunda de todos, inclusive a minha, e acho que faz exatamente isso. Está nos empurrando para fazer melhor e evoluir, mas tendo grande empatia para com o lutas que todos nós enfrentamos como humanos.”

Louhimo acrescenta : “Minha inspiração foi definitivamente o pensamento de empoderar e as músicas darem um sentimento de força e sensibilidade. E interpretarmos as músicas de nossos corações e almas com força total, sem deixar dúvidas sobre o quão apaixonados somos como vocalistas e artistas.”

“Bitch Fire”, a música mais representativa, é um metal poderoso à la Warlock, da diva alemã Doro Pesch. Lembra um pouco os clássicos do Accept, com bateria e baixo retos e guitarras em cavalgada e carregadas de peso nos refrões.

As duas vozes, ao contrário do que se poderia esperar, se complementam e criam um ambiente de energia e nostalgia, algo que se repete em outra boa canção, “Time to Kill the Night”, com melodias poderosas e ganchudas.

A fórmula neste álbum é bem conhecida, já aplicada nos projetos Allen-Lande (Russel Allen, do Symphony X, e Jorn Lande, ex-Masterplan) e Allen-Olzon, este com a ex-vocalista do Nightwish Anette Olzon. É power metal bruto, mas com teclados proeminentes, e sem firulas, com canções direcionadas e sem muito espaço para invenções.

Por mais que as moças se esforcem, falta um pouco de feeling e diversidade nas dez canções, que parecem ter saído diretamente da mesma fórmula, o que é a mais pura verdade. 

“Tongue of Dirt” e “Viper’s Kiss” por muito pouco não se tornam a mesma canção, pois o molde é o mesmo, mas há outras boas ideias, como em “Walk Through Fire”, um metal mais moderno, e “Dancers of Fire”, que agrega mais elementos dos anos 80. É um disco interessante por reunir duas grandes vozes do metal europeu, mas perde um pouco em vitalidade na comparação com o Noora Louhimo Experience.

A polonesa Marta Gabriel é a voz da banda de power metal Crystal Viper, veterana da cena pesada do leste europeu. Cantora de excelentes recursos, preferiu não inventar em sua primeira iniciativa solo e fez um básico disco de versões de clássicos do rock e do metal cantados por mulheres.

Tudo é muito simples e direto, como se tivesse sido obra de uma collab ao vivo. “Metal Queens” é o óbvio título do álbum, e a faixa-título (original da canadense Lee Aaron) ganha uma versão totalmente NWOBHM (New Wave of British heavy Metal), com seu ar épico.

“Max Overload”, da banda Acid, é um petardo quase punk, lembrando bastante o Iron Maiden da fase Paul Di’Anno. “Light in the Dark”, da banda Chastain, é um rock clássico bastante reverente ao original, enquanto que “Mr. Gold”, do Warlock, é a melhor canção, mais bem produzida e com guitarras bastante afiadas.

Apesar de básico, “Metal Queens” é bacana porque Marta fugiu do óbvio e homenageou bandas e cantoras importantes do metal mas que nunca tiveram o merecido reconhecimento.