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 Marcelo Moreira

E a solução, em plena pandemia, veio dos “States”… Foi necessária a intervenção de uma gravadora norte-americana para convencer o cantor e multi-instrumentista paulista Fabiano Negri a não encerrar a sua longa e prolífica carreira musical.

“The Fool’s Path”, seu álbum de 2020, chamou bastante a atenção e esteve em várias listas de melhores do ano no rock nacional, inclusive na do Combate Rock. Negri só informou que estava parando com a carreira de 25 anos quando lançou o álbum.

Dono de uma escola de música em Campinas (SP) e requisitado produtor musical, integrou bandas como Rei Lagarto e Dusty Old Fingers, além de gravar e lançar quase uma dezena de ótimos álbuns solo. 

Mesmo sabendo das dificuldades e do pouco reconhecimento do rock feito em inglês, insistiu até onde deu e “The Fool’s Path”, de certo modo, reflete a desilusão de m artista de qualidade que não encontra apoio ou mesmo um público cativo ou ao menos disposto a ouvir músicos do underground.

“Eu tinha decidido que este era o melhor caminho. Estava cansado de produzir material autoral inédito e não sair do lugar, não observar um mercado que desse um mínimo de apoio ou interesse. Estava decidido a parar”, diz Negri.

Foi então que veio o selo americano Big Can Productions, que entrou em contato com o músico campineiro e propôs um acordo para que um novo trabalho começasse a ser produzido ainda em 2020. Surgiu “Reborn”, que será lançado em duas partes, cada uma com cinco músicas, em princípio.

D e acordo com o músico, foi um trabalho difícil por ter sido elaborado e gravado em período de isolamento social. “Tudo virou de cabeça para baixo, a pandemia mudou tudo, desde conceitos e até a forma como enxergamos muitas coisas. Gravei todos os instrumentos e as vozes, quase tudo em um take só, como eu gosto, de forma muito sincera e honesta. Meu filho Ian tocou baixo e percussão em uma das músicas.”

A primeira parte de “Reborn” tem cinco músicas e retrata, de certa forma, o renascimento musical do artista e como está encarando a vida em confinamento e sem shows e espetáculos presenciais. 

“Creio que o acordo com a Big Can foi fundamental, pois esse álbum foi feito e foi necessário em um momento da minha vida em que eu mais precisava de música e fazer música. É a minha essência”, analisa Negri.

Nos últimos álbuns ele passeou pelo rock pesado, pela soul music, pelo blues, pelo folk acústico e até pelo eletrônico/industrial. Em “Reborn” a decisão foi retornar ao hard rock mais básico e direto, como já vinha ensaiando em “The Fool’s Path”, embora aqui o conceito mais elaborado tenha levado o disco para uma seara mais progressiva.

“Inside Out” abre o primeiro EP e mostra um entusiasmo quase juvenil ao expor uma musicalidade mais direta. O tema é mais reflexivo, só que transborda energia e otimismo em tempos tão sombrios.

“In the Face of Desire” e “Gazing” são canções interessantes, nas quais a guitarra é o fio condutor em linhas melódicas bem simples, apostando em refrões de matiz mais pop.

“Ready to Go” e “Reborn” são tentativas de resgatar uma sonoridade do rock setentista e mantém o pique em alto astral, com boas ideias e arranjos inventivos, embora sem grande arroubos.

Seria difícil, em tão pouco tempo, Negri criar novas músicas que superassem a qualidade e a intensidade de “The Fool’s Path”. Seu estado de espírito era outro em plena pandemia e com o firme propósito de parar de produzir. 

Se, por enquanto, “Reborn” não alcançou a excelência obtida no álbum anterior, revela-se, provavelmente, o trabalho mais importante da carreira de Fabiano Negri, já que aponta para um futuro auspicioso em pleno momento de trevas e incertezas por conta da covi-19 e sua pandemia devastadora. 

A América nos fez um grande favor ao resgatar a musicalidade e a qualidade do trabalho de um importante artista underground do Brasil.