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 Marcelo Moreira

E o inimaginável aconteceu na pátria da democracia moderna: invasão de Congresso e tentativa de golpe explícito para impedir a certificação de um presidente eleito no voto e confirmado em, todas as instâncias.

Havia indícios de que a insanidade fascista que cercava Donald Trump poderia cometer desatinos e até violência, mas ninguém imaginava que o próprio imbecil ex-presidente incitaria o atentado à democracia em vídeo e em várias postagens nas redes sociais.

Coragem ou desespero? Ainda não dá para caracterizar o que realmente aconteceu no Capitólio de Washington, mas certamente a mensagem passada é muito clara: a democracia, para o fascismo moderno mundial, é um entrave a projetos de poder.

E é triste perceber que o rock passou muita vergonha quando as câmeras de TV e de fotógrafos captaram na linha de frente da invasão Jon Schaffer, guitarrista e líder da banda Iced Earth, importante nome do heavy metal tradicional norte-americano. 

Conservador assumido, o músico, que toca também com o Demons & Wizards, ao lado de Hansi Kursch (Blind Guardian) e com o Sons of Liberty (projeto paralelo de cunho político), esteve ao lado do imbecil que usou chapéu de viking e na invasão.

Se ele mantinha a linha em seu conservadorismo nas letras e músicas do Sons of Liberty, demonstrando certa moderação e apreço pela democracia, decidiu nos últimos tempos chafurdar na lama ao defender abertamente Donald Trump e sua agenda negacionista, mentirosa, criminosa e asquerosa.

No entanto, por mais que ele utilizasse termos como “precisamos livrar o país do comunismo e da China”, quem poderia imaginar que o cara estaria liderando a marcha da insensatez e o atentado covarde institucional contra a maior democracia do mundo?

Jon Schaffer durante a invasão  do Congresso em registro feito por um site americano (FOTO: REPRODUÇÃO)

O Iced Earth surgiu com força no final dos anos 80 como um nome de peso no chamado power metal norte-americano quando o mercado ainda apostava no hard rock e no thrash metal.

Nos anos 90, a banda cresceu, apesar das mudanças constantes de integrantes e ganhou proeminência com a chegada do ótimo cantor Matt Barlow, que ficou por mais de 15 anos à frente do grupo.

Investindo em temas fantásticos e de ficção científica como metáfora para problemas modernos e muita raiva política, Schaffer ganhou respeito de músicos americanos e europeus, tornando o Iced Earth grande na Alemanha e na Grécia, por exemplo.

Com a saída de Barlow, que se tornou seu cunhado e também policial em Nova York, o guitarrista recrutou ninguém menos do que Tim “Ripper” Owens, o cantor que substituiu Roib Halford no Judas Priest. 

Foram dois álbuns muito bons já nos anos 2000, um deles “The Glorious Burden”, abordado temas militares históricos e a história dos Estados Unidos no segundo CD, que contém a épica e longa “Gettysburgh 1863”, com a história trágica da batalha decisiva da guerra civil norte-americana.

Neste trabalho já era possível perceber o seu conservadorismo e a sua abordagem peculiar, digamos assim, a respeito de fatos históricos. 

Owens começou a se incomodar com certas coisas a respeito do pensamento de Schaffer e acabou demitido de forma vergonhosa e desrespeitosa. Barlow voltou temporariamente até que o canadense Stu Block foi contratado.

Curiosamernte, mantém uma amizade de décadas com o cantor e baixista alemão Hansi Kursch, do Blind Guardian, banda que tem algumas afinidades com o Iced Earth. Formaram juntos o projeto Demons & Wizards, que lançou o terceiro disco no ano passado, muito bom por sinal. Neste projeto, a política passa longe.

Coisa que já não acontece com o Sons of Liberty, no qual Schaffer toca guitarra e assume os vocais. A banda lançou um CD e um EP e serve como um veículo para a disseminação de suas ideias conservadoras, com letras recheadas de passagens da constituição americana e de discursos de políticos e presidentes históricos dos Estados Unidos. Mesmo destilando um conservadorismo apaixonado, neste projeto o guitarrista demonstrava certa moderação e um pouco de sobriedade.

Ao protagonizar cenas asquerosas de atentado à democracia e de fidelidade canina – e burra – a Donald Trump, Schaffer joga sua carreira no lixo, abrindo mão de seu prestígio – se é que restava algum.

Passou a caminhar lado a lado com figuras sinistras e alienadas como o guitarrista veterano Ted Nugent, notório extremista de direita que odeia imigrantes, adora fazer provocações racistas e defende apaixonadamente a disseminação de armas pelos Estados Unidos. 

Seu mais recente vídeo nas redes sociais, postado no final de 2020, explicitou o quão lamentável sua figura se tornou.

Jon Schaffer certamente ainda terá uma série de seguidores acéfalos e nefastos, mas está destinado à lata de lixo da história, assim como Trump, que se recusa, como uma criança birrenta, a reconhecer que perdeu muito feio a eleição de 2020.

P.S.: Agradecimentos ao radialista e professor Julio Feriato, grande roqueiro, por alertar nas redes sociais que o líder do Iced Earth protagonizou essa vergonha.