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Muito já foi escrito sobre a banda e alguns de seus integrantes, mas curiosamente Peter Tork nunca foi alvo de uma biografia – o único entre os integrantes a ser “esquecido”, digamos assim. Coube a um escritor carioca a tarefa de preencher o espaço.

“Love Is Understanding”, de Sergio Farias, é uma obra interessante porque, além de reconstituir a vida de Tork – nascido Peter Hansen Thorkelson, em 1942 , mostra um outro lado da engrenagem da indústria de entretenimento do rock e da TV. 

Deixa muito claro o tamanho do moedor de carne que destrói carreiras e reputações e as consequências que causam nas vidas dos ex-astros – Tork virou garçom e músico de rua após falir, e ser abandonado por duas esposas, também em razão do alcoolismo.

“A escolha, para mim, era óbvia: era o único integrante que ainda não tinha uma biografia, mesmo em inglês. Nas minhas pesquisas, a minha escolha se provou acertada, pois Tork tem a personalidade mais fascinante”, diz o autor. 

Farias quis contar uma história interessante de uma forma simples e rápida, reta, sem rebuscamento ou recursos estético-literários, como costumam fazer os biógrafos de rock ingleses, por exemplo. 

É uma leitura fácil, mas que às vezes pode ser penosa por conta de alguns detalhes excessivamente destrinchados. 
No entanto, isso se mostra necessário em razão da fundamental contextualização histórica e também nas explicações de como funcionavam o mundo da TV americana dos anos 60 e os mecanismos do rock em Hollywood. 

Se não há revelações inéditas, o livro é importante por retratar o personagem mais discreto e o que mais se deu mal ao final da banda – justamente por isso talvez tenha sido o que menos recebeu atenção da imprensa e dos escritores de rock.

Ao contrário do que todo mundo pensava, Tork, de ascendência norueguesa, era um intelectual, multi-instrumentista (tocava sete instrumentos) e poliglota (além do inglês, falava francês, alemão, espanhol e era razoável em japonês).

Dos quatro integrantes, era o mais articulado e contestador, sendo o primeiro a “tretar” quando ficou claro que os produtores musicais e da TV não deixariam que os Monkees tocassem em seus próprios discos – eles só punham as vozes em músicas compostas por outras pessoas especialmente para a série de TV. 

Um outro mérito da obra é mostrar, de forma detalhada e didática, a crueldade da máquina de criar e destruir celebridades instantaneamente, e do efeito que isso causava em jovens pobres ou remediados que ficavam ricos do dia para a noite – e que perdiam tudo em curto espaço de tempo assim que caíam no ostracismo.

Com evidente afeição e apreço pelo biografado, Sergio Farias, com apoio de farto material de pesquisa, não ameniza quando narra o período em que Tork desceu ao inferno, mas aproveita para ressaltar como Tork era o gente boa da banda, retratando o líder e guitarrista Michael “Mike” Nesmith como autoritário, centralizador, autossabotador e “traíra”. 

Já o baterista e cantor Micky Dolenz e o cantor Davy Jones emergem como artistas individualistas e egocêntricos, com interesse muito mais no que a banda poderia proporcionar do que na própria carreira da banda. Peter, por sua vez, seria o intelectual e referencial musical dos Monkees, com sua vida despreocupada, generosa e totalmente hippie.

Farias narra com detalhes como Tork se tornou o “amigão da galera”, com seu jeitão ripongo e mansão aberta a todos. Jimi Hendrix passou duas temporadas morando ali, enquanto a banda Crosby, Stills and Nash foi formada em uma das amplas salas da casa. 

Músico de origem folk, Tork ficou magoado com os amigos David Crosby e Graham Nash, já que nem cogitaram seu nome para participar quando aceitaram a inclusão de Neil Young pouco depois. Ele era rico e estava por cima, pensaram os dois. Anos depois, com Tork na pior, não lembraram mais do então amigo.

O livro é importante por ser a melhor (única?) biografia dos Monkees em português, resgatando boas histórias a respeito de quatro músicos que integraram uma banda pré-fabricada e as consequências de se rebelarem contra o mundo artificial que tentaram lhes impor.