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Allen Key (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Uma vida em poucos segundos. Ou na duração de um álbum denso, difícil, conceitual e extremamente pessoal, mas que representa boa parte de nossa existência. Soa profundo, mas é apenas rock and roll, pesado, mas intenso forte.

Duas bandas brasileiras aproveitaram a pandemia e mostraram que do pior dos mundos é possível extrair o que mais se aproxima de um manifesto em tempos difíceis e desafiadores. 

A paulista Allen Key mergulha fundo nas emoções e em um conteúdo denso e reflexivo; a catarinense XEI & Sons in Black investe na conscientização e na mensagem política, ainda que de forma mais abrangente e não específica.

“The Last Rhino” é o primeiro álbum da banda Allen Key. É um hard rock moderno com nítidas influências de Halestorm e Evanescence, pois evidencia o talento da cantora e pianista Karina Menascé, nome que certamente vai ganhar destaque na cena roqueira nacional. 

Karina também canta na banda Mercy Shot, mais voltada para o stoner, mas aqui mostra um talento excepcional para as composições. Toca piano e canta divinamente em um desfile de canções pesadas com temas soturnos e reflexivos, embora as mensagens passem um certo otimismo e esperança. 

É diferente do que se lançou no mercado em 2021 porque a banda não teve medo de ousar e enveredar por uma sonoridade mais identificada com um rock que abusa de afinações mais baixas e timbres mais pesados de guitarras quando isso já era dado como algo fora de mora.Produzido, mixado e masterizado por Wagner Meirinho no estúdio Loudfactory, na capital paulista, The Last Rhino contém oito músicas com peso e melodias versáteis e cativantes, além do vocal potente e de timbre único de Karina.

A vocalista é quem escreveu todas as músicas. “São a minha realidade. Basta ler as letras da Allen Key para entender um pouco da minha vida. É meu diário”, diz a moça.

As faixas de “The Last Rhino foram compostas em diversos momentos da Allen Key, algumas desde quando eram apenas Karina e o guitarrista Victor Anselmo da atual formação, além de outras que ganharam novos contornos com a entrada de Pedro Fornari (guitarra) Felipe Bonomo (bateria) e William Moura (baixo).

A banda faz um som diferente, que tem alguma semelhança também com as bandas Weedevil e Lâmmia – vocais femininos poderosos e guitarras muito pesadas, onde é possível perceber que os dois aspectos são grades diferenciais.

Os músicos buscaram de forma incessante timbres diferentes e uma atmosfera mais intimista, como na faixa-título.
A capa do disco é uma ideia ‘maluca’ e complexa da Karina, que ganhou vida por Ricardo Bancaleiro. 

A ideia, ela conta, era fazer uma capa que se formasse a partir de cada capa dos singles e por isso cada uma tem um rinoceronte em distintas situações, de acordo com a letra da música. “E a história do rinoceronte é uma analogia à trajetória da Allen Key: a banda nascendo e vivendo”, ressalta Karina.

XEI & Sons in Black era, inicialmente, um projeto paralelo do cantor e instrumentista catarinense Alexei Leão, referência no rock pesado brasileiro. Ganhou fama com a banda de metal tradicional Stormental e participação em diversos projetos cultuais em Santa Catarina.

Há algum tempo morando em Portugal, criou o projeto paralelo ara se manter perto do rock e contou com velhos parceiros catarinenses para tirar do bolso “CXoulrophobia”  que está em vias de se tornar uma banda de fato. 

O álbum não é conceitual no sentido estrito que conhecemos, mas utiliza a coulrophobia (palavra em inglês que descreve o medo de palhaços) como metáfora para os graves problemas sociopolíticos de alguns países, entre os quais, claro , o Brasil. 

O som transita entre o rock pesado e o progressivo, com ecos interessantes da banda norte-americana Savatage, especialmente nos arranjos vocais e linhas de guitarra. 

Leão é um ótimo cantor e compositor que também utiliza sua versatilidade com ator para interpretar de forma elogiada os “roteiro” de cada canção. É um trabalho de extremo bom gosto que precisa ser melhor divulgado.

Habilidoso compositor, Leão consegue imprimir ritmo e leveza a um tema pesado e que remete às histórias de horror, com uma correspondência assustadora com a realidade de nossa sociedade, principalmente na questão política – é uma alegoria, mas a semelhança com o lamentável panorama sociopolítico brasileiro é explícito.

“Coulrophobia” é um dos melhores trabalhos do rock brasileiro nos últimos cinco anos e que seria um disco extraordinário em termos de divulgação se não fosse a pandemia de vocid-19.