Escolha uma Página

Marcelo Moreira



Frequentemente considerado o mais subestimado guitarrista inglês, Robin Trower costuma emendar quando perguntado sobre isso: “Não posso reclamar. O que obtive em minha carreira 99% dos guitarristas da história não conseguiram. Sou um privilegiado.”

É uma postura modesta, mas que também revela um pouco de amargura por observar que é muito mais admirado pela imprensa especializada e pelos colegas músicos do que pelo público em geral. 

Trower completa 75 anos como uma lenda do rock pesado britânico, mas também do blues europeu. Sua pegada firme, eclética e o timbre limpo, mas sonoro e pesado, influenciou gerações de guitarristas.

Sempre desconversou sobre o quanto de verdade existe na história de que as comparações com Jimi Hendrix o atrapalharam. Uma grande besteira. Ele se comparava mesmo era consigo mesmo, sempre exigindo mais e mais e melhor.

Como Hendrix é um extraterrestre, um Pelé da música, a base de comparação tinha ser um patamar abaixo. E então ele teve de competir com uma legião de craques – Rory Gallagher, Peter Frampton, Peter Green, Mick Box, Manny Charlton, Ritchie Blackmore, Jimmy Page…

Virou lenda e referência, mas a carreira solo foi errática, especialmente depois de 1983, após dez álbuns importantes. A inspiração parece o ter abandonado, embora tenha recuperado parte do prestígio nos anos 2000 quando voltou a se unir ao baixista e vocalista Jack Bruce (ex-Cream) para dois CDs, um deles ao vivo.

Ecos de seu estilo podem ser observados nos trabalhos elogiados de gente como Pat Travers, Joe Bonamassa e Warrey Haynes (Gov’t Mule e Allman Brothers), onde se destacam os fraseados cheios de feeling mergulhados em arroubos psicodélicos.

Nascido em 9 de março de 1945 em Catford, Inglaterra, Trower passou o início dos anos 60 tocando guitarra em vários conjuntos de Londres, sendo o grupo de R&B Paramounts o de maior sucesso, especializado principalmente em versões de clássicos do blues. A banda lançou alguns singles entre 1963 e 1965, mas sem repercussão.

As coisas começaram a melhorar um pouco quado se juntou ao Procol Harum, liderado pelo excêntrico e obsessivo tecladista Gary Brooker. 

A banda já tinha estourado com “A Whiter Shade of Pale”, mas era uma formação instável de estúdio. Brooker não teve dúvidas quando quis uma banda de fato: o primeiro a ser chamado foi Trower, ex-companheiro de Paramounts. 

Entre 1968 e 1971, a dupla esteve junta nos primeiros cinco álbuns do Procol Harum. Até que durou demais a parceria, a julgar pelos egos em confronto, embora de forma controlada. A banda era de Brooker e Trower queria brilhar e voar.

A carreira solo demorou a engrenar, ainda amais no formato trio carreira solo. Ele via o Taste e o Budgie, mais pesados, alcançando bons resultados e decidiu calibrar as cordas para deixa r coisa mais hard rock. Segui os passos dos americanos do Mountain e do Grand Funk Railroad.

O grande suporte do começo foi o cantor e baixista James Dewar, parceiro de muitos anos. Reg Isidore, o primeiro baterista, foi logo substituído por Bill Lordan e o trio começou a ter repercussão com o álbum “Twice Removed from Yesterday”.

Entretanto, foi com “Bridge of Sighs”, de 1974, que o sucesso apareceu nos dois lados do oceano Atlântico e ofuscando a estrela da guitarra britânica blues da época, Rory Gallagher, agora fora do Taste. E então começaram as comparações inadvertidas e inadequadas com Jimi Hendrix, morto em 1970.

Foram dez anos alucinantes e de bons álbuns, que venderam bastante. Só que os anos 80 vieram e a estrela do guitarrista começou a apagar, como ocorreu com diversos artistas e bandas de rock setentistas.

Pressentindo as mudanças de vento, Trower acatou uma sugestão de empresários e fez uma parceria com Jack Bruce, que também sofria os mesmos problemas que o guitarrista – uma estrela de primeira grandeza nos anos 70, de sucesso, mas que via a inspiração sumir e as vendas caírem.

Era um tempo de muita efervescência cultural e musical. Tinha muita coisa acontecendo e a dupla teve dificuldasde de enter aquele mundo de 1982. 

Foram dois álbuns ótimos até o ano seguinte – “B.L.T.” e “Truce”-, mas sem causa impacto. Sem uma direção definida, faiscando entre o jazz e o blues, os discos foram considerados foram de moda. A separação foi inevitável.

Os anos 80 foram de trevas para Trower, que acabou aceitando uma breve reunião de uma das formações clássicas do Procol Harum entre 1990 e 1992, que rendeu um álbum inexpressivo, “Prodigal Stranger”, em 1992. 

Uma inusitada parceria com o cantor Bryan Ferry resgatou a sua autoestima. Trabalharam juntos em três álbuns do cantor, sendo que Trower também atuou como coprodutor, até que decidiu voltar à carreira solo nos anos 2000, lançando quase dez álbuns de boa qualidade, sempre transitando no blues rock, mas sem grande repercussão. Ganhou destaquem entretanto, com “Seven Moons” e “Seven Moons Live”, já no começo dos anos 2010 ao lado de Jack Bruce.

Em celebração aos seus 75 anos, está sendo reeditada uma caixa com dez CDs do seu período áureo como artista solo. São os trabalhos lançados entre 1973 e 1983 pela Chrysalis Records, incluindo o megassucesso “Bright of Sighs” e os dois álbuns de 1981 com Jack Bruce. 

É um brilhante resumo de um guitarrista extraordinário. Subestimado? Talvez, mas ele tem razão quando diz que foi um privilegiado. Sua guitarra incandescente e encharcada de sentimento fizeram parte de uma história para lá de vitoriosa dentro do rock.