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O impacto foi quase o mesmo de quando os Beatles abraçaram a psicodelia, em 1966, com “Revolver”, ou quando s Rolling Stones caíram nas pistas de dança com “Some Girls”, em 1978. Foi um passo gigantesco para o desconhecido, e deu muito certo, mas e então surgiu a grande questão: o que viria depois? Seriam capazes de se manter no posto máximo, ou mesmo de entrar para a história da música como um marco?

O risco do U2 com “Achtung Baby” foi calculado, mas imenso e arriscadíssimo. Abalaram as estruturas da música pop, criaram novos conceitos, viraram referência e dividiram as atenções da época com o nascente movimento grunge. Nunca mais foram os mesmos, para o bem ou pra o mal.

Há 30 anos o quarteto irlandês gravo o álbum que vai ser lembrado como uma ruptura com os padrões oitentistas e uma mudança radical de postura. Saíram os conceitos políticos e as músicas intimistas e vieram canções mis acessíveis e definitivamente pop, com o mundo eletrônico ganhando proeminência. O U2 invadia as pistas de dança.

A tão propalada obra máxima os irlandeses também foi a sua perdição, dirão alguns. Outros certamente afirmarão que foi graças a “Achtung Baby” se tornou uma banda tão gigante quanto os Rolling Stones ou Metallica. Foi o último suspiro de qualidade e criatividade dos irlandeses, como sugere um interessante artigo do site do jornal espanhol El País? Acesse aqui a versão em português.

Impactante, excessivo e exagerado, “Achtung Baby” mudou paradigmas, mas é uma injustiça com os irlandeses considerá-lo a maior obra de suas carreiras. Pode ter sido o mais impactante, o de maior sucesso, o que mais vendeu, mas nem de longe é o melhor da discografia. Perdem em qualidade e densidade para os estupendos “The Unforgettable Fire” e “The Joshua Tree”, e em frescor e urgência para “War”.

Curiosamente, um dos hits maiores do disco é uma canção que remetia aos tempos mais antigos. “One” recupera o tom messiânico e abusa menos dos elementos eletrônicos. Foi uma tentativa de manter os pés em canoas diferentes? Pode até ser, mas a banda mergulhou com competência no “novo mundo” pop, o que não que dizer que tenha construído uma obra-prima.

O disco cumpriu o seu objetivo de redefinir os rumos da carreira do U2 oferecendo uma abordagem criativa na música pop encharcada de elementos eletrônicos – “Even Better the Real Thing” é o melhor exemplo – e estabeleceu parâmetros novos para quem queria ganhar o mundo, só que a mudança trouxe consequências que podem não ter agregado o que se esperava.

Valeu a pena ter aberto mão de um legado estrondoso e elogiável para buscar o topo a bordo de um pop mais acessível e nem tão estrelado? “Achtung Baby” foi o auge do U2 e o começo de sua decadência? Será que eles nunca mais fizeram ou farão um álbum tão bom quanto os dos anos 80?

“All That You Can’t Leave Behind”, de 2000, desmente essa tese. O flerte com o mundo eletrônico arrefeceu neste disco, em que uma volta a um passado não tão distante foi tentada sem muita convicção, o que talvez tenha contribuído com o bom resultado musical.

De forma injusta, não possui o status de obras-primas já citadas, mas foi o mais premiado do grupo irlandês no Grammy, com sete troféus na principal premiação musical do mundo. A excelente “Beautiful Day” rendeu três estatuetas na edição de 2001 da honraria, entre as quais a da categoria “Canção do Ano”.

“Achtung Baby” foi sim um disco bem importante na história da música, talvez mais pelo impacto que teve do que pela qualidade em si, e não pode ser penalizado com a pecha de ser ” a origem da decadência” dos irlandeses. Não foi um passo em falso, tanto que seu sucesso e a prova disso, mas o mergulho eletrônico praticamente enterrou aquela banda rebelde e instigante que construía grandes hinos políticos.