Blues paulistano ganha espaço colaborativo inspirado em festival norte-americano

Houve um tempo em que as pessoas saíam às rusa em São Paulo, nas tardes de final de semana, pata tocar samba e um pouco de jazz. Faz tempo, e isso era possível quando a violência urbana estava relativamente controlada. 

ão era preciso muito: um cavaquinho, um violão, um surdo e um pandeiro e estava feita a roda de samba no centro da cidade, em lugares como as imediações da estação da Luz, no Bexiga e nas ladeiras do bairro da Bela Vista que seguiam para a avenida Paulista.Os músicos chegavam, se arrumavam e começavam a tocar. As pessoas rodeavam, cada vez mais em maior número, de graça, e estava feita a grande festa. Era uma tradição maravilhosa, que foi se perdendo com o tempo.

Algumas tentativas de recuperar esse espírito ocorreram neste século, como o Jazz nos Fundos, em Pinheiros (z0na oeste) e as rodas de samba da antiga e finada Mercearia São Pedro *Vila Madalena, zona oeste). A avenida paulista, aos domingos e feriados, fechada ao tráfego, às vezes resgata o espírito, mas ainda de forma atabalhoada em um certo ordenamento.

O Sampa Stage Blues promete mudar esse espírito também na zona oeste da capital paulista. Uma vez por mês, no primeiro sábado, os amantes do blues poderão se reunir, com entrada franca, para ver e ouvir os melhores músicos do gênero da cidade e do Estado – e, possivelmente, do Brasil, a depender do sucesso da empreitada.

A ideia é tão boa que tem tudo para entrar para o calendário de eventos musicais da cidade, como ocorreu com o Jazz nos Fundos. Que existe há 12 ano virou produtora de shows. Existem planos para que seja possível, dependendo da demanda e de horário vagos, que músicos amadores ou iniciantes cheguem de surpresa e toquem um pouco para mostrar o seu trabalho.

Quem criou o Sampa Stage Blues é o guitarrista e cantor paulistano Duca Belintani, veterano do blues nacional e o primeiro brasileiro a tocar nos festivais de rua e de bares de blues de Clarksdale, no Mississippi, Estados Unidos, o berço do blues. A passagem dele por lá em 2024 foi tão frutífera que rendeu a gravação de um CD ao vivo, lançado no final do ano passado.

Belintani é o curador da iniciativa. “Consegui datas até fevereiro, sempre no primeiro sábado de cada mês. Se der certo, e acho que vai dar, poderemos renovar o acordo de cessão do espaço. Tudo ainda incipiente, e sem custos, justamente para fomentar uma cena e criar um hábito. A entrada será gratuita.”

Quem cedeu o espaço foi o Nimbus Studio & Bar, que fica na rua Duílio, 35, na Lapa, quase esquina com a mítica rua Guaicurus e muito próximo da estação Lapa da CPTM e do Tendal da Lapa. Nas imediações, resistem bares e praças que apostam, em pequenas rodas de samba e apresentações acústicas de pop rock – sem falar na proximidade do Sesc Pompeia.

Na passagem por Clarksdale, em 2024, Belintani constatou como a tradição centenária do blues foi capaz de revitalizar uma cidade minúscula que já esteve entre asa mais miseráveis dos ricos Estados Unidos. São centenas as histórias a respeito do “deus” Robert Johnson pela cidade, aquele que teria feito um pacto com o demônio… (veja o file “Crossroads”, de 1986).

Foi nas ruas da idadezinha, durante o festival, que despontou o guitarrista e cantor Christone “Kingfish” Ingram, um os nomes mais celebrados do blues da atualidade. Joe Bonamassa, o blueseiro mais importante do blues hoje, com sua guitarra, é m dos patronos.

“A cena é tão rica e estimulante que é capaz de misturar tradição e modernidade sem que sem que o espírito seja maculado”, diz Belintani. “O blues é tudo ali, e e em todo lugar tem gente tocando, principalmente nas rus. Foi assim que enfiei as caras e consegui espaço para mostrar o meu trabalho.”

“Live at the Juke Joint” vai gravado por meio de um celular de boa qualidade, e traz um blues rústico e seminal, misturando composições clássicas e autorais do guitarrista brasileiro.

A aura de cumplicidade e solidariedade – “tudo belo blues é dos lemas presentes em todos os lugares de Clarksdale – que ele, no improviso, ganhou a ajuda de um baixista que estava na plateia em uma das apresentações, já que tinha viajado na companhia apenas de um baterista brasileiro, o amigo Vinas Peixoto.
A informalidade era tanta que o baixista americano saiu do espaço do diminuto do show, terminou de beber a sua cerveja e foi embora, sem dar tempo ao menos de Belintani perguntar o seu nome – trata-se de M.M. Jackson, como o brasileiro apurou ao alcança-lo.

“Esse espírito colaborativo e de irmandade me estimulou a fomentar algo parecido em São Paulo. Já houve ambiente parecido muito tempo atrás. A maior cidade do hemisfério sul tem vocação espaço para esse tipo de camaradagem para recriar uma cena”, explica Belintani.

A inauguração do projeto será no dia 1º de novembro com o gaitista e cantor Ivan Marcio, de Santo André (ABC Paulista), um artista veterano que já gravou álbuns em Chicago, nos Estados Unidos, com renomados músicos locais, além de ter integrado as bandas Prado Brothers, Igor Prado Band e Brazilian Blues Bash.

Serviço

Sampa Stage Blues

Rua Duílio, 35, Lapa, São Paulo-SP

Dia 1º de novembro (e todo primeiro sábado de cada mês até fevereiro)

Horário: 17h (abertura do espaço)

Primeira atração: gaitista Ivan Marcio

Curadoria: Duca Belintani

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