A cada nota que sai da viola, a história transborda e mostra relevância e a magnífica qualidade da música instrumental brasileira. O paulista Ricardo Vignini e o mineiro Bruno Maia transformaram a viola caipira, aquela de cordas, em instrumento de liderança dentro do panorama brasileiro, acrescentando uma excelência artística poucas vezes vista por aqui.
Vignini tem mãos mágicas capaz de subverter canções emblemáticas d Led Zeppelin, Pink Floyd e Sepultura em coisas completamente maravilhosas e inovadoras ao lado do parceiro Zé Hélder no Moda de Rock. Na carreira solo, é a brasilidade que impera, como no recente disco solo, o oitavo, “Cristalino”.
Embora em termos sonoros básicos seja um retorno ao instrumental mais puro do interior brasileiro, o músico paulista agrega muito valor ao tornar certas partes mais palatáveis a um público acostumado com sinergias.
O diálogo entre música urbana e de raiz é perfeito ao combinar o uso de violas limpas e as eletrificadas, como ele fez quando gravou com a banda Mano Sinistra. O som é diferente e instigante.
“Cristalino” transborda história e densidade. Também combina modernidade e tradição pela forma como os timbres foram escolhidos e trabalhados. Delicadeza, sutileza e contundência se entrelaçam em um desenho majestoso de uma música grande e intensa.
“Jogo de Espelhos” e “Domingo na Vila” abrem o álbum “Cristalino” e já entregam a beleza das notas caprichadas e no bom gosto na escolha dos arranjos. O dedilhado é, como diz o álbum, cristalino, limpo e desafiador. As oito faixas são ótimas e certamente é o melhor e mais versátl de sua carreira solo.
Ao longo de quase três décadas de carreira, vem redefinindo o papel da viola caipira dentro e fora do Brasil, colocando o instrumento em diálogo com os mais variados gêneros musicais, testando os limites e possibilidades do instrumento de um jeito que vai além do usual.
“Cristalino” é uma paisagem sonora em alta definição, como define i próprio artista enfatizou
As oito faixas realçam a versatilidade de Ricardo Vignini, sendo seis composições próprias, uma parceria com Índio Cachoeira e uma releitura de “Menino da Porteira” (Teddy Vieira e Luizinho), o álbum “Cristalino” percorre diversas atmosferas da música instrumental brasileira ao jazz-rock.
A faixa “Polyando” presta tributo a Poly, instrumentista, ativo nas décadas de 1940 a 1980. Já “Boca do Asfalto” homenageia o trombonista Bocato, cuja herança musical inclui uma dupla caipira formada por seu pai.
Em “Domingo na Vila”, Vignini rememora sua infância no bairro da Vila Santa Catarina, zona sul paulistana. A faixa-título, “Cristalino”, traz uma introspecção poética inspirada em sua recente cirurgia de catarata, que transformou sua maneira de ver — por dentro e por fora.
O álbum tem participações de seis músicos convidados. O violinista norte-americano Seth Byrd em “Jogo de Espelhos”; Ricardo Berti assina todas as baterias; André Rass nas percussões; e os baixos ficam por conta de Fernando Nunes, Pedro Macedo e Renan Dias.
Minas Gerais em destaque

“Vertentes de Lá e Cá” é o terceiro álbum do projeto Braia, uma encarnação paralela do multi-instrumentista e cantor mineiro Bruno Maia. Ele é o líder da banda de folk metal Tuatha de Danann e é especializado em música celta-irlandesa, além de ser um pesquisador de história musical brasileira.
O novo trabalho é um projeto realizado pela Braia Produções, com patrocínio da Lei Paulo Gustavo de Minas Gerais, e propõe um tributo sonoro e visual ao estado mineiro, seus personagens, marcos históricos e paisagens simbólicas.
Composto por 12 faixas — sendo 10 instrumentais e 2 cantadas — o álbum mergulha na diversidade cultural e na memória coletiva de Minas Gerais, exaltando suas raízes com sensibilidade e profundidade.
Produzido por Bruno Maia, que também assina os arranjos e interpreta diversos instrumentos (viola caipira, flautas, teclados, contrabaixo, bouzouki e violão), o trabalho será disponibilizado gratuitamente no site www.braia.net.br, acompanhado de um encarte digital completo.
Cada faixa virá acompanhada por uma ilustração exclusiva, criada pelo artista Thiago Brito, além de um texto explicativo e um vídeo sobre o tema abordado. Os vídeos contarão com legendas e tradução em Libras, reforçando o compromisso do projeto com a acessibilidade e a democratização da arte.
O single “Emboabas” tem vocal, viola, baixo, teclado e flautas de Bruno Maia, com participação de Clayton Prosperi nos vocais, teclados de James Freitas e bateria e percussão por Artur Guidugli.
“Emboabas”, faixa de abertura do novo álbum e uma das poucas canções não instrumentais do disco, revisita um capítulo crucial da história mineira: a formação da região e o conflito conhecido como Guerra dos Emboabas (1707–1709).
Com forte carga simbólica e crítica, a música aborda a luta pelo controle das recém-descobertas minas de ouro, travada entre os bandeirantes paulistas e os chamados emboabas, forasteiros vindos sobretudo da Bahia e de Portugal, apoiados pela Coroa Portuguesa. Ao resgatar esse episódio, Bruno Maia expõe as origens de uma lógica predatória de exploração e concentração de riquezas que atravessa os séculos no Brasil.
A vitória dos emboabas consolidou o domínio colonial e resultou na criação da Capitania de Minas Gerais, reforçando estruturas de poder e desigualdade que ainda hoje moldam o país.
Ouça “Emboabas” em todas as plataformas de streaming ou pelo link a seguir:
https://open.spotify.com/intl-pt/track/2IwVRmnTpdtdOMo0Elkvz7?si=935186df3af9442