Parece notícia velha, mas o movimento punk de São Paulo reviveu alguns e seus momentos mais trágicos no último final de semana. Quando se imaginava que briga de gangues era coisa do passado e rivalidades tinham sido superadas, uma pancadaria com morte mancha o que era para ser uma confraternização pacífica.
O Centro Cultural Tenda da Lapa, na zona oeste da capital, recebeu o festival gratuito “200 Anos de Punk”, organizado pelo coletivo de mesmo nome, com shows e atividades culturais. – entre as atrações estavam as ótimas bandas DzK e Fogo Cruzado.
Com ótimo público, o evento transcorreu sem Incidentes. Tarde da noite, tempos após o final do festival, em local não muito distante do Tendal da Lapa, houve uma briga entre dois grupos e uma mulher, identificada como Helen Cristina Vital, foi brutalmente espancada e morreu em decorrência dos ferimentos.
As informações sobre o incidente são muito poucas e a Polícia Civil ainda estão no início das investigações. Testemunhas da briga ainda não apareceram e há desencontro a respeito de quem teria participado do espancamento.
Em longa mensagem nas redes sociais, o coletivo 200 Anos de Punk lamentou a morte de Helen Vital e mostrou certa desilusão com a cena punk ainda assolada pela violência, principalmente depois de um evento tão legal e bem organizado – leia a mensagem non final do texto.
O movimento punk paulistano incorporou parte da estética violenta que parecia “romântica” no auge dos eventos de Londres no final dos anos 70. As brigas de gangues da periferia da capital paulista foram travestidas DE movimento sociocultural e os grupos rivais realmente levaram a sério. as rivalidades.
Surgiram grupos punks por toda a Grande São Paulo a partir de 1979 e ficaram famosas as brigas entre as gangues do BC e da capital, com muita gente ferida com gravidade alguns relatos de mortes – parte delas não confirmadas.
O punk perdeu força no mundo a partir de 1980 E, No Brasil, de 1984 muito por conta do clima de violência e do radicalismo ideológico. O discurso de bandas com mais de 40anos de trajetória, como Garotos Podres, Ratos de Porão, Cólera e DZK, ainda fazem muito sentido e atraem uma juventude antenada, engajada e bem informada. A violência parecia coisa do passado.
É cedo para especular sobre as motivações para o crime e se realmente é um incidente isolado – que é o que parece ser. A questão é que a violência no movimento se torna uma arma eficaz nas mãos dos inimigos da arte, da cultura e dos ideais progressistas, especialmente em tempos de polarização, radicalização e de fortalecimento do fascismo.
Leia o manifesto do coletivo 200 Anos de Punk:
“ Qual violência é pior?
Sofremos violência todos os dias, seja pelas pressões socioecônomicas, seja por repressão policial, falcatruas do governo, julgamentos de grupos religiosos, racismo, machismo, homofobia e tantos outros tipos de violência ao nosso dia a dia.
Através do punk, nós achamos uma válvula de escape para essa realidade cruel e achamos um motivo pra celebrar e sorrir, dando sentido à isso que chamamos de vida.
Esse festival foi um evento construído por esse coletivo que ama o punk e viveu ele através das décadas com seus altos e baixos.
O evento do domingo foi elaborado e desenvolvido por meses, feito de punks para os punks e rolou na tranquilidade. Estávamos todos extasiados de ver todas as gerações do punk reunidas e ter conseguido concluir o evento com sucesso e sem maiores ocorrências.
Até que, na segunda pela manhã, nos chegou a notícia que houve uma briga na rua, após o término do evento que acabou culminando com a morte da punk Helen Vitai, que era mãe e deixa uma filha pequena.
O coletivo 200 anos de punk é um coletivo cultural, de punks para punks. Nós repudiamos e condenamos qualquer tipo de violência de punk contra punk. Sabemos que todos gostarem de todos é uma utopia, mas todos respeitarem à todos é um objetivo a ser ainda alcançado dentro do nosso movimento. O diálogo deveria ser sempre o caminho.
Desde o início, o movimento punk, infelizmente, é marcado por episódios de violência e isso só nos afasta uns dos outros, fecha espaços e enfraquece a nossa cena.
Nossos visuais e discursos agressivos são como uma carapaça de proteção contra tudo isso que nos é imposto todos os dias. Mas quando isso extrapola um limite e se torna autossabotagem dá a impressão que não entendemos nada, não evoluímos nada.
Nossos mais sinceros pêsames aos familiares e amigos próximos e que os responsáveis por essa atrocidade sejam identificados e arquem com as consequências.
Seguiremos tentando construir, somar e passar nossa visão!
Paz entre nós, guerra aos senhores!”