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Com a grande chance desperdiçada em 1982, ninguém mais apostava no Black Sabbath, que capengava cm discos apenas razoáveis e um cantor esforçado, mas que emulava Ronnie James Dio. Tony Martin foi o grande responsável por manter a banda em pé e na ativa depois dos fracassos de Ian Gillan, Glenn Hughes e Ray Gillen nos vocais.

Os discos da era Martin non final dos anos 80 são bons, mas longe da genialidade de um “Volume 4” ou “Heaven and Hell”. As vendas eras fracas e o dinheiro, escasso, enquanto o prestígio caía sem parar. Os gigantes agora abriam festivais para bandas novas e, frequentemente, ruins.

Sem medo de praticar injustiças e traições, Tony Iommi finalmente deu o sinal verde para que empresários negociassem a volta de Ronnie James Dio após a intermediação do baixista Geezer Butler. Ele e Dio tinham feito as pazes em 1989 e o baixista até deu uma canja em um show solo do vocalista.

Para lembrar: Dio substituiu Ozzy Osbourne em 1979 no Black Sabbath, gravou dois ótimos discos e um ao vivo, mas os egos colidiram e a briga com o guitarrista Tony Iommi e o baixista Butler foi feia. Dio e o baterista Vinny Appice deixaram o Black Sabbath em 1982, antes do lançamento de “Live Evil”.

Não foi uma negociação fácil. Dio ainda tinha muitas mágoas e, por mais que a carreira solo estivesse perdendo um pouco do fôlego, ainda assim dava para seguir em frente. 

Enquanto isso, o vocalista Tony Martin e o baixista Neil Murray ficaram sabendo que estavam demitidos sem serem avisados oficialmente, em um constrangimento geral que nunca preocupou Tony IommI.

Black Sabbath em 1992, reeditando a formação de dez anos antes: da esq. para a dir., Geezer Butler, Ronnie James Dio, Tony Iommi e Vinny Appice (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Foram duas conversas sérias entre o cantor e o guitarrista. Pareciam ter acertado os ponteiros no final de 1991 e assim, no começo de 1992, veio a bomba: a encarnação do Black Sabbath do começo dos anos 80 estava de volta, com gravação de novo álbum e turnê mundial – que começaria no Brasil no meio do ano.

As aparências engaram por pouco tempo. Dio começou a rever sua participação quando soube que o baterista seria Cozy Powell, amigo de Iommi e com longa carreira em grandes bandas. Os dois tocaram juntos no Rainbow, de Ritchie Blackmore e não se deram bem.

Havia um impasse, que foi resolvido pelo acaso. Powell era apaixonado por carros velozes e equitação. Durante o lazer em uma hípica, na Inglaterra, o cavalo que montava se desequilibrou e o derrubou. Pior, caiu em cima dele. Powell fraturou a bacia e ficaria imobilizado por meses. 

Como negócios são negócios, Iommi substituiu o (ex-)amigo e teve de se render à pressão de Dio: chamou Vinny Appice para o projeto, meio a contragosto.

Velha química

O entrosamento no estúdio voltou rapidamente e Dio se tranquilizou com achegada de Appice. E “Dehumanizer”, o disco, surpreendeu pela extrema qualidade e pelo gás com que os quatro encararam o projeto – mais uma vez com a participação, como músico de apoio, de Geoff Nicholls, tecladista/guitarrista e baixista.

O disco vendeu muito bem, embora menos do que o esperado, mas recolocava o Black Sabbath de volta ao jogo dez anos depois do desastre na mixagem de “Live Evil”, que causou  separação.

Dio se comportou bem e topou mudar a forma de escrever as letras – diminuiu a fantasia e o terror, investindo mais em temas mais atuais à época, como a tecnologia e ameaças políticas. “Computer God”, o primeiro single, teve execução maciça em emissoras de rádio, assim como “Time Machine”, que acabou incluída na trilha sonora do filme “Wayne’s World” (“Quanto Mais Idiota, Melhor”).

São duas canções fortes e muito pesadas, onde os riffs nada ficam a dever a clássicos dos discos “Heaven and Hell” (1980) e “Mob Rules” (1981). “Computer God” impressionou por conta da introdução tribal de bateria e pela letra quase apocalíptica. “Timer Machine” era veloz, quase thrash metal, com um trabalho vocal ótimo.

Outros destaques do álbum era a densa “I” e a dramática “After All”, com seus riffs estupendos e um solo bem bacana que elevava a canção a alto patamares.

Em termos musicais “Dehumanizer” tinha tudo para recuperar parcialmente o prestígio da banda e poderia ter sido um ponto de recuperação dos bons tempos do começo dos anos 80. No entanto, Ozzy Osbourne e Tony Iommi se uniram para estragar todos os planos. 

A turnê pelos Estados Unidos caminhava para o final e a banda foi surpreendida pela decisão de OPzzy de anunciar a sua “aposentadoria” da música. Para isso, faria dois grandes concertos de “despedida” na Califórnia em novembro de 1992 com alguns convidados, entre eles os antigos companheiros de Black Sabbath. Surpreendentemente, Iommi e Butler aceitaram, assim como o semiaposentado Bill Ward, o baterista original.

 Furioso, Dio encontrou a desculpa que precisava para pular fora. Recusou-se a participar da festa e anunciou que estava saindo da banda, obrigando o Black Sabbath a recorrer aos favores de Rob Halford, que tinha saído do Judas Priest.

O Black Sabbath tocou nos dois dias logo antes da banda de Ozzy, para encerrar as noites trocando quatro músicas com o antigo vocalista. – tudo isso virou um CD duplo ao vivo.

Reunião da formação clássica e uma nova banda

Como todos sabem, a aposentadoria de Ozzy não durou nem dois anos, tanto que em 1995 ele fechou o Monsters of Rock de São Paulo. Inacreditavelmente, Black Sabbath chamou novamente Tony Martin para cantar nos álbuns “Cross Purposes” (1994) e “Forbidden” (1995), discos apenas razoáveis e que tiveram pouca repercussão.

Diante de tanta confusão, era inevitável que alguém propusesse uma reunião da formação clássica do Black Sabbath, já que Ozzy saíra da aposentadoria. O cantor exigiu que Iommi repartisse os direitos sobre o nome da banda e então uma turnê americana, com shows posteriores na Europa, foram marcados para 1997, que renderam o CD duplo ao vivo “Reunion”, que continha duas músicas inéditas gravadas em estúdio.

Também de forma surpreendente, as coisas correram bem até 2005, quando Ozzy comunicou que retomaria a carreira solo e que dificilmente se reuniria com a banda antes de 2008 ou 2009.

Essa decisão coincidiu com a preparação de uma coletânea do Black Sabbath da fase Dio. O cantor já tinha reatado a amizade com Geezer Butler novamente que fez a ponte com Iommi para que os três compusessem três músicas novas para a coletânea.

Não demorou muito para que os três anunciassem um novo retorno daquela formação, com o mesmo Vinny Appice na bateria. O problema era o nome: Ozzy vetou o uso de Black Sabbath, obrigando a alteração para Heaven and Hell, ou seja, uma banda nova com cheiro de 30 anos atrás (na época).

Entre 2007 e 2009 o grupo lançou um disco e estúdio e outro ao vivo e, aparentemente, as coisas seguiam nos trilhos, por mais que relatos de jornalistas e prestadores de serviços informassem que havia um clima estranho quando da passagem deles pelo Brasil em 2009. 

Quis o destino que, desta vez, a interrupção da terceira encarnação ocorresse por motivos de saúde. Dio descobriu um câncer no estômago e as atividades foram paralisadas. O tratamento durou apenas quatro meses, e o cantor morreu em abril de 2010, aos 67 anos de idade.

“Dehumanizer” foi um álbum importante, pois quase fez renascer a mística dos gigantes do heavy metal. Mais uma oportunidade desperdiçada em um momento em que o metal estava acossado pelo grunge e precisava, mais do que nunca, de um retorno triunfante de um nome forte. Fez história não pela sua qualidade, mas porque representou nova oportunidade perdida.