Na pátria dos guitarristas de rock e do blues, o nome mais estrelado da atualidade é o de uma veterana de voz rouca e forte apadrinhada pelo maior nome blueseiro da atualidade, que é Joe Bonamassa.
A guitarrista inglesa Joanne Shaw Taylor, exímia instrumentista e compositora, reúne as melhores características do cenário musical inglês, que é a fusão de blue e rock, além de possuir um timbre único, o sonho de qualquer guitarrista.
Depois de ano escalando a montanha, recebeu a ajuda estrondosa de Bonamassa na produção de seu álbum “The Blues Album”, uma colaboração que ajudou a musicista a subir de patamar.
O mergulho profundo no blues, com a parceria com Bonamassa, foi o ponto de virada na carreira da artista inglesa: com fama e prestígio maiores, teve cacife para alçar voos maiores e experimentar novas ideias. E então começa a sentir o sotinho de ser estrela.
A base é o blues, mas o horizonte aumentou bastante com a inclusão de fartos elemento de soul, country e folk e até mesmo funk, em uma mistura elegante de grandes riffs e ótimas melodias mais acessíveis, de inegáveis pinceladas pop. Foi assim com os álbuns “Nobody’s Fool”, “Heavy Soul” e agora com o recém-lançado Black & Gold”.
Entre os méritos que ela acrescentou foi a de “hitmaker”: demonstra uma grande habilidade para compor músicas simples que, em muitos momentos, exalavam certa sofisticação, como é o caso do mais novo álbum, “Black & Gold”.
Ela esbanja bom gosto na escolha do repertório e dos timbres de guitarra mais limpos em “Heavy Soul”.
Para os puristas e fãs mais radicais, a notícia não é boa.

A supervisão, mais uma vez, é do produtor Kevin Shirley, parceiro de primeira hora de Bonamassa e habitual colaborador d Iron Maiden e Dream Theater. Foi ele que que mixou as gravações e as levou para a masterização por Bob Ludwigç
O resultado é orgânico excelente, sendo uma excelente amostra a canção “All The Things I Said”, uma canção soberba com um feeling magistral – é a alma da música. O mesmo é constatado no arranjo acústico/elétrico de “Hold of My Heart”, onde a voz rouca de Shaw Taylor se destaca pura e claramente.
O bom gosto prevalece na captação das guitarras e nas sobreposições de suas camadas, acrescentando peso e consistência nas canções mais blueseiras e sutileza quando o folk e a soul music predominam.
Joanne brilha em riffs instigantes, como em “I Gotta Stop Letting You Let Me Down”: a slide guitar (do antigo Black Crowe Audley Freed?) se destaca ainda mais na interação com as linhas de órgão que Jimmy Wallace lança. Esses ruídos também aparecem com a distinção do piano deste último em “What Are You Gonna Do Now?”, que também contrasta com as fórmulas de “Summer Love”.
Quando esses cerca de quarenta e seis minutos terminam, ocorre-me a ideia de que os projetos de estúdio de Joanne Shaw Taylor poderiam se beneficiar muito da presença de toda a sua banda de turnê.
O time de músicos é de primeira – o baterista Anton Fig (da banda Letterman, do programa David Letterman, liderada por Paul Schaffer) e o guitarrista Doug Lancio (John Hiatt, Bob Dylan) – e a participação obrigatória do amigo e mentor Joe Bonamassa, em duas faixas (“All The Things I Said” e “Who’s Gonna Love Me Now?”).

“Grayer Shade of Blue” é ouro destaque e se beneficiaria muito desta última abordagem – som orgânico e guitarras sutis e contundentes ao mesmo tempo. Mas, mesmo assim, essa faixa continua sendo um dos destaques do álbum, graças ao violino de Savannah Madigan: seu acompanhamento lúdico compensa efetivamente a qualidade cantada da performance geral. E, junto com “Hold Of My Heart”, essa seleção mais do que compensa a sensação mecânica que emana de “Hell Of A Good Time”.
Inexplicavelmente, “Black & Gold” não conta com o single independente de 2024, uma versão de “Wishing Well”, do Free (do último álbum, “Heartbreaker”). Tão carinhoso quanto profundo, não apenas se encaixaria confortavelmente em justaposição com trechos de sua prolífica produção, como “I Gotta Stop Letting You Let Me Down”, mas também complementaria perfeitamente este conjunto de material com a faixa final de “Love Lives Here”, do Fces.
Esses covers também podem iluminar a importância de composições como “What Are You Gonna Do Now”, tornando redundantes as notas pessoais bem-intencionadas que Shaw Taylor oferece em cada conjunto de letras.
Se associarmos o novo álbum com o relançamento de “Heavy Soul”, do ano passado, temos um panorama luminoso para a carreira de uma das mais interessantes do blues rock da atualidade.
Produzido e também supervisionado por Kevin Shirley, “Heavy Soul” foi gravado em Nashville, nos Estados Unidos, e apresenta originais quanto covers do JST, incluindo uma versão fiel e fabulosa de “All the Way from America”, do álbum “Me Myself I”, de Joan Armatrading, de 1980. Um clássico atemporal e algo raro: um hino do rock escrito por uma mulher.
“Someone Like You” ainda é reconhecível como Van Morrison, mas sua execução é emocionante – um vocal generoso, esfumaçado e comovente, com guitarra e piano de arrepiar. “Devil in Me” (outro solo de guitarra arrasador), com seu apelo e resposta, é puro gospel, enquanto “Change of Heart”, escrita com Beth Nielsen Chapman, encerra o álbum com um toque arrebatador, mesmo com a letra falando de vulnerabilidade e ousadia em correr riscos pelo amor.
“Black Magic”, que começou como instrumental, é a Nova Orleans mais pura e suja, impulsionada por uma batida insistente e apresentando um solo de piano de dar água na boca, além do trabalho de guitarra incendiário de Taylor “Drowning in a Sea of Love”, um sucesso do início dos anos 70 de Joe Simon, é apropriadamente retrô. A faixa-título, com Fender Squire do JST gritando, parece o momento culminante de um show, mas então ela a acalma com o funk “Wild Love”.
“Contagiada” por Joe Bonamassa, Jpanne Shaw Taylor parece ser incapaz de lançar um álbum ruim. Ela está no topo do blues da atualidade ao lado do mentor e das “concorrentes” Samantha Fish, dos Estados Unidos e Ana Popovic, da Sérvia.