Uma das edições mais impactantes dos 57 anos da revista veja foi aquela que registrou a morte de John Lennon, em 1980. A capa trazia o roso do ex-beatle e a frase logo abaixo: “Lennon e o nosso tempo”. O editor da capa acertou em cheio.
Um sentimento parecido toma conta de roqueiros em, geral ao saber da morte do guitarrista Ace Frehley aos 74 anos. Em um acidente trivial dentro do estúdio. Com sua morte, muito da memória de infância de apreciadores de rock foi embora com o músico.
Assim como ocorreu quando o Kiss anunciou o seu fim, em dezembro de 2023, fica agora um sentimento de vazio, de orfandade. Uma parte de nós foi embora, junto com bons momentos de nossa infância;
É como a imagem maravilhosa mostrada na animação de longa-metragem, “Divertida Mente”, em que as emoções de uma adolescente são representadas por emoções no cérebro. Quando os brinquedos de infância vão lentamente sumindo ds lembranças, fica o vazio e um forte sentimento de perda.
Dentro de um mndo de fantasia criado magistralmente por um instinto fenomenal de marketing, Ace Frehley, o guitarrista rebelde encharcado de feeling bluesy , parecia ser a parte mis real do sonho dourado de história em quadrinhos Entre os quatro heróis mascarados, Ace, o “Spaceman”, era o mais compenetrado, o mais centrado, o mais preocupado em se comunicar por meio da música.
Entre bonecos, gibis, lanccheiras e outras quinquilharias, a impressão era de que o rock and roll verdadeiro do Kiss emanava diretamente da guitarra Gibson de Ace Frehley, com seus riffs gordurosos e transbordantes de sentimento e de verdade.
Ace era a alma ou a essência do Kiss – ou os dois? Não. Seria pedantismo e presunção fazer tal afirmação, ainda mais porque o Kiss era uma banda que tinha som próprio e uma imagem definitiva. Mas é um fato: quando Ace Frehley deixa a banda, no final de 1982, o buraco ficou imenso.
A analogia é cabível: assim como Keith Richards, o guitarrista dos amados Rollign Stones, uma das bandas favoritas de Ace, “Spaceman” representava o espírito do rock, seja com os riffs e solos definitivos ou nas divergências públicas com o guitarrista Paul Stanley e o baixista Gene Simmons – os chefes -, Ace dava a impressão de que era a reserva moral da banda.
Não é pouca coisa ser reconhecido como a reserva de autenticidade de um colosso musical e comercial como o Kiss. Ace Frehley parte levando grandes memórias de nossa infância e juventude. Representava uma era em que as coisas pareciam menos complicadas e mais definidas, em que era mais fácil se identificar com ídolos e imagens que faziam parte da moldagem do caráter.
Assim como Jimmy Page (Led Zeppelin), Eric Clapton, Keith Richards, Pete Townshend, Sergio Dias e Raul Seixas eram os melhores companheiros em quartos escuros e recreio solitários, para uma geração, Ace Frehley representou o mesmo para a geração seguinte. Ajudou a abri as portas de um mundo fascinante, memorável e perigoso.
Kiss era o símbolo da rebeldia e a banda mais antissistema que existia nos anos 70, ao lado dos punks, por mais que soe herético fazer a associação. Era uma banda “satânica” que aterrorizava pais, professores e políticos de um mundo conservador embalado por uma ditadura militar sangrenta e criminosa.
A guitarra de Ace Frehley era a navalha afiada que nos permitida enfrentar e encarar tempos sombrios e difíceis. Também, por isso, e muito por isso, já merece uma estátua eterna em nossas mentes corações.