Nem ele sabia como ainda está vivo. Nunca soube como resistiu a cinco décadas de heavy metal se submetendo a todo tipo de excesso etílico e de drogas, algo comparável só á trajetória do imortal Keith Richards, guitarrista dos inacabáveis Rolling Stones.
Ozzy Osbourne conseguiu atingir a mesma marca que o amigo Lemmy Kilmister, do Motorhead, morto há dez anos: chegou aos 70 anos de idade com fôlego, apesar das escorregadas no álcool e nas drogas e nas polêmicas familiares.
Ozzy teve uma vida fascinante e teve todas a merecida homenagens, as últimas no dia 5 de julho passado, em um festival com várias estrelas do rock que presenciaram a despedida do cantor inglês dos palcos ao lado de sua banda, a mítica Black Sabbath.
Morto aos 76 anos, Ozzy simbolizou o heavy metal, gênero que ajudou a criar, e escreveu algumas das melhores (e piores) páginas da história do rock. Tem de ser reverenciado pela qualidade das músicas que gravou e pela importante figura que se tornou, mas também será lembrando pelas presepadas e fatos jocosos que protagonizou – morder morcego, cheirar formigas, mijar na estátua do Álamo, no Texas.
Mais do que imortal e “imorrível”, Ozzy foi o bastião da resistência de um subgênero musical em constante mutação e sob saraivada de críticas. Ele não gostava de falar sobre isso, mas é o maior símbolo do metal.
Ronnie James Dio (1942-2010) ganha todas as votações de melhor cantor de rock e metal, mas é Ozzy que aparece na mente de todos como a personificação de um modo de vida, daquele mundo idílico que adolescentes de algumas gerações sempre sonharam em pertencer.
“É meio contraditório que eu ainda esteja aqui – às vezes acho um milagre, mesmo eu jamais tendo planejado chegar a essa idade cantando nos palcos”, disse o cantor em entrevista coletiva quando esteve em São Paulo.
É claro que ele soube que sempre esteve longe de ser o melhor. Entretanto, foram raras as vezes em que deixou de ser o maior de todos.
Como imaginar que aquele moleque delinquente de Birmingham, que ganhava uns trocos como flanelinha no estádio do Aston Villa, que trabalhou em metalúrgica e em um matadouro, que abandonou a escola e admitiu algumas vezes que não era “tão inteligente”, se transformaria na personificação do metal?
Quem diria que o louco Ozzy seria um dos responsáveis por criar o heavy metal ao lado dos companheiros do Black Sabbath? E como seria loucura imaginar que um Ozzy gordo e ainda mais louco, já fora da banda, superaria os episódios pitorescos e bizarros que protagonizou nos palcos, como morder um morcego vivo? Ou arrancar a cabeça de uma pomba viva em uma reunião de executivos de gravadora?
Pior ainda: o que dizer – e ter de engolir – Ozzy e família protagonizando um reality show de TV meio mambembe, em que muitas vezes era retratado como um pai roqueiro debiloide à beira da senilidade?
Não foram poucas as lambanças, mas as vitórias foram muito mais numerosas e significativas, principalmente para quem o viu nas duas vezes em que veio com o Black Sabbath nos últimos anos e na recente turnê brasileira deste ano.
Seus shows solo deste século são previsíveis, assim como as suas “escorregadas” no palco e as gafes cometidas aqui e ali. Só que, quando entra no palco, vira Ozzy, o mito que personifica o heavy metal.
Era a própria história viva, bem à frente, que grita o seu mágico “I Love You All” e que manda uma série de hinos que hipnotizam e que levam à insanidade.
Não foram poucos os que, no show paulista deste ano, bradaram chorando na pista: “Você é a razão de eu gostar de música e de rock”.
O Príncipe das Trevas, aquele que assustou pais e professores dos anos 70 e 80, alucinou, emocionou, exagerou e engrandeceu nossas vidas por meio século, despediu-se da vida em altíssimo estilo.