A paixão de Paul Weller pela canção deu origem a algumas das mais belas páginas da música pop britânica desde sempre. Apaixonado pelas composições de Pete Townshend (The Who), Ray Davies (The Kinks) e Burt Bacharah, transformou-se no principal cronista musical de sua geração.
O rock ainda é a base de todo, desde os tempos de The Jam, mas o mergulho no jazz e no pop sofisticado com a banda Style Council abriu imensas possibilidades e o guitarrista inglês criou um estilo único para criar melodias maravilhosas e contar histórias de forma sofisticada.
Depois de um período em silêncio por conta da pandemia, Weller voltou à carga lançando trabalhos primorosos, como “66”, do ano passado, em que brilha ao revisitar o passado e fazer ternas reflexões sobre o envelhecimento e a passagem do tempo.
“Fond El Dorado”, lançado em julho passado, soa como uma continuação estética, só que mais diversificada e mostrando um artista mais expansivo, ainda eu a sutileza e a delicadeza continuem predominando em um conjunto de canções bem construído e harmônico.
A versão para I Started a Joke”, dos Bee Gees, já indicava o caminho a ser trilhado. Acentuando ainda mais a melancolia e a tristeza da canção. Foi uma sábia e surpreendente escolha para o primeiro single. É um começo para o passeio baladas folk músicas nostálgicas de ares sessentistas movidas a violões, basicamente.
E a nostalgia é um componente importante de álbum repleto de versões para músicas nada óbvias a ponto de Paul Weller ressignificá-las e lhes dar nova vida e nova chance. ´W um músico que sabe muito das coisas. É o caso de “Nobody’s Fool”, uma canção de Ray Davies para a trilha de um seriado de TV.
O rol de artistas homenageados é variado e, de certa forma, excêntrico, como Richie Havens, Felix Pappalardi, Robin Gibb e o fundador da Incredible String Band, Clive Palmer. As canções soam belas na simplicidade imposta por Weller, que exercita de forma inapelável seu dom inerente de bom arranjador.

Em contraste com sua coletânea de covers anterior, “Studio 150”, de 2004 – frequentemente analisado como o beco sem saída da decadência dos anos 2000, antes da ascensão de “As Is Now” e “22 Dreams” trazerem a promessa de horizontes mais sóbrios, porém mais aventureiros, e cujas seleções pareciam atreladas a uma ortodoxia que se tornara um tanto esclerosada – “Find El Dorado” é uma escapada por trilhas menos percorridas, encontrando inspiração em músicas únicas fora do cânone do cool.
Pode ser o caso da improvável “Pinball”, o sucesso de 1974 do improvável cantor e ator britânico Brian Protheroe. Uma espécie de novidade, embora grooveada em sua forma original, nela Weller encontra novas texturas e a revira de forma definitiva.
Como a maioria das faixas do “Find El Dorado”, a música é austera, sem frescuras, com a produção sendo em grande parte obra do guitarrista Steve Cradock, parceiro de longa data de Weller, com um pequeno elenco de músicos de alto calibre – incluindo os bateristas Steve Pilgrim e Ben Gordelier, o cofundador da OG Jam, Steve Brookes, no violão, e o saxofonista Jacko Peake.
A abertura do álbum fica por conta de “Handouts In The Rain”, de Richie Havens, com os vocais adicionais de Declan O’Rourke, A participação estrelada fica por conta do amigo Noel Gallagher, do Oasis, que toca guitarra, discretamente, em “El Dorado”, de Eamon Friel.
Talvez a intrusão mais eficaz e apropriada seja a do tocador de kora Seckou Keita, que adiciona belos bordados a uma versão do excêntrico single de Duncan Brown, “Journey”, de 1974. Weller conheceu Keita em um show do Africa Express em 2016, onde dividiram o palco com o Gorillaz de Damon Albarn e a Orchestra of Syrian Musicians, e desde então tem ansiado pelos tons arejados do kora.
“Excêntrico”, no bom sentido, descreveu grande parte da tomada de decisões de Weller após “22 Dreams”, como bem definiu a revista inglesa “Mojo”. É caso da música de White Plains, a deliciosamente excêntrica “When You Are A King”.
Na mesma toada está “Lawdy Rolla”, interpretada em vigoroso estilo gospel por Weller, é uma faixa da dupla afro-francesa de R&B do final dos anos 60, The Guerrillas (com Manu Dibango no saxofone) – uma verdadeira joia para os garimpeiros.
Outro destaque baseado no groove é “Where There’s Smoke, There’s Fire”, um single de Willie Griffin de 1984, na obscura gravadora Grip, de Dallas: uma gravação estranha, com um som “fora de moda” e com sonoridade elástica.
O trabalho de Paul Weller é primoroso e costuma ser precioso. Ao emprestar seu talento interpretativo para “contar histórias” de ouros luminares da música pop, ele oferece novas perspectivas para canções que mereciam olhares e ouvidos atentos décadas depois de sus lançamentos. Mostra também que é um ourives de primeira classe no garimpo de joias es