Fazia tempo que ele não recebia um telefonema de um grande amigo. Gostava de conversar como conterrâneo que um dia foi rival e concorrente.
O problema é que ficou constrangido em recusar o convite do amigo: o guitarrista Tony Iommi convidava o mito Robert Plant, ex-Led Zeppelin, para o concerto final, de despedida, do Black Sabbath e de Ozzy Osbourne, em 5 de julho passado.
“Agradeci, mas afirmei que esse mundo não era mais o meu e que não fazia sentido eu participar”, disse o cantor de 77anos.
O “novo mundo” dele, que é tudo, menos novo, pode ser conferido, mas uma vez, no sofisticado e sossegado álbum “Saving Grace”, recém-lançado trabalho em que mergulha ainda mais fundo na música folk e britânica e no country americano, gêneros que abraçou neste século.
Sem a mesma capacidade vocal dos anos 70,Plant se reinventou como intérprete de canções tradicionais e fez uma dupla de sucesso com a cantora country americana Alisson Krauss. Não convenceu muito como cantor country, mas aproveitou para redescobrir a beleza crua e simples do folk inglês;
Sentindo-se confortável como novo registro da voz, faz bem o papel de bardo – às vezes de menestrel – dando vida a um cancioneiro que remete às orgens da música anglo-saxã, passeando por influências gaélicas e da Inglaterra arcaica. “Saving Grace” está anos-luz do rock, mas é de uma beleza comovente.
Não há como não se emocionar com a comovente balada irlandesa “I Never Will Marry”, com seus arranjos etéreos e dramáticos carregados de história e intensidade.
A parreira da vez é a ex-professora de música Suzi Dian, que é creditada como cointérprete na capa do álbum. Os duetos inspirados ao longo do trabalho mostram que Plant acertou em cheio na escolha, mas são duas canções que exaltam a qualidade dos vocais da companheira: “Higher Rock” e “Too Far From You”, em que ela aparece divina dividindo os vocais com um generoso astro do rock.
A presença de Suzi Dian nos faz imediatamente recordar de ”Battle of Evermore”,do Led Zeppelin, quando o cantor fez um dueto magistral com a musa folk britânica Sandy Denny (1947-1978); São ecos do passado que que não assombram, mas encantam.
Por um lado, “Saving Grace” parece ingênuo, mas é mera impressão. O que poderia acontecer, Plant refletiu, se ele levasse para casa o que aprendeu com T. Bone Burnett, Alison Krauss e outros e fizesse um dueto de covers de blues, country alternativo e folk com a ex-professora de música nascida em Brum, Suzi Dian?
Em 10 músicas intimistas habilmente ornamentadas pelos guitarristas Matt Worley e Tony Kelsey e pelo violoncelista Barney Morse-Brown, a mágica acontece.
Tão afável mestre da vibração quanto Golden God, Plant cede um pouco do território vocal principal para Dian (‘Too Far from You’) e Worley (‘Soul of a Man’, de Blind Willie Johnson), ao mesmo tempo em que traz uma seriedade extra para ‘Ticket Taker’, do The Low Anthem, soprando harpa crua e reinventando ‘Everybody’s Song’, do Low, como uma raga psicodélica. Este é Plant como um musicólogo entusiasmado, compartilhando inspirações e passando bastões.