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O formidável disco “Inter Mundos”, da banda brasileira Caravellus, reacendeu o interesse pelos temas históricos do Brasil e o mergulho nas raízes culturais nordestinas, seja no contexto da história, seja no uso sem moderação de instrumentos musicais mais ligados aos ritmos nacionais.

É uma tendência bacana resgatada no ano passado, com o excelente “Vera Cruz”, do cantor Edu Falaschi (ex-Angra e Almah), que contou com uma superprodução e convidados muito especiais.

Neste texto reunimos alguns dos álbuns do rock e heavy metal brasileiros que mergulharam na história do Brasil em álbuns conceituais que estão entre as melhores coisas já gravadas por aqui:

– Caravellus – “Inter Mundos” – A brasilidade aqui não é o tema principal, mas ser de base para uma história interessante movida a guitarras pesadas, arranjos orquestrais excepcionais e um vocal que é dos melhores dos últimos anos, gravado pelo incansável Leandro Caçoilo, que canta também no Viper e no Hardshine. É um trabalho que será lançado em 17 de junho, mas que tem fôlego, em que houve um aprofundamento das raízes brasileiras da banda (maracatu, ciranda, frevo, caboclinho, coco de roda) combinadas com heavy metal, rock progressivo e jazz). O Brasil e o Nordeste são os panos de fundo de uma história alegórica sobre a vida e a morte, com amplo sentido filosófico.

– Angra – “Holy Land” – clássico do metal nacional, este disco de 1996 mergulha fundo na história brasileira e traz arranjos surpreendentes e uma interpretação extraordinária de todos os integrantes à época naquele que é considerado o melhor disco do grupo e que o catapultou ao sucesso internacional. Embora não seja conceitual no sentido de contar uma história, suas canções passeiam por áreas como o descobrimento do Brasil e passagens do Brasil Colônia, em um trabalho admirável de construção de letras e recriação de “paisagens sonoras”.

– Edu Falaschi – “Vera Cruz” – Com o DNA de um ex-Angra, o épico lançado em 2021 se tornou rapidamente um clássico do metal nacional por conta de seu capricho e pela qualidade alta das canções, além de ter sido meticulosamente projetado e elaborado. A história narra a trajetória de personagens que tiveram participação no descobrimento do Brasil e na maravilhosa saga portuguesa de desbravamento dos mares e continentes. A pesquisa histórica e a elaboração do argumento e roteiro tiveram a participação Falaschi e do cantor e pianista Fábio Caldeira, da banda Maestrick, de São José do Rio Preto (SP).

– Dorsal Atlântica – “Canudos” – Outro clássico instantâneo que sedimentou a volta da banda carioca ao mercado depois de alguns hiatos. É uma obra conceitual por se basear nos eventos históricos da chamada Revolta de Canudos, ocorrida entre 1896 e 1897 no interior da Bahia e em arredores do que hoje são os Estados de Alagoas e Sergipe. O cantor e guitarrista Carlos Lopes foi bastante habilidoso ao construir climas e um roteiro que permitem explicitamente fazer analogias com a atualidade, especialmente com livres associações com os tempos tenebrosos em que vivemos política e socialmente no Brasil. O disco foi lançado em 2017.

– Voodoopriest – “Mandu” – Álbum poderoso de metal extremo que narra, em inglês, as agruras dos povos indígenas nos 500 anos de dominação branca-europeia n Brasil. Embora não seja conceitual no sentido estrito do termo, tem como base a trajetória do líder indígena Mandu, que liderou rebeliões no interior do Piauí e do Maranhão no século XIX. Cru e pesadíssimo, oscila entre o thrash e death metal e faz jus aos elogios fartos que recebeu quando de seu lançamento, em 2014, com o ótimo vocalista Vitor Rodrigues (ex-Torture Squad e atual Tribal Scream).

– Torture Squad – “Esquadrão de Tortura” – Obra corajosa do então trio paulistano lançada em 2013. Apesar do título em português, as canções são em inglês e abordam o período da ditadura militar brasileira, que vigorou de 1964 a 1985. Fruto de muita pesquisa e entrevistas com jornalistas, historiadores e sobreviventes das torturas, se tornou um libelo pela liberdade e democracia, realçando o caráter obviamente criminoso das condutas dos militares na “guerra” contra oposicionistas e “comunistas”, um balaio em que eram jogados todos os desafetos do regime militar, incluindo anticomunistas que caíam em desgraça. Em entrevista ao programa de web rádio Combate Rock à épóca, o baterista Amílcar Christófaro disse que o objetivo não era “denunciar a ditadura, mas entender o que tinha acontecido e os porquês de tudo, tentando evitar tomar partido”. O resultado, como não poderia ser outro, foi a confirmação de que a ditadura foi um período de trevas para a vida brasileira, muito violento e sob o signo do terrorismo de Estado.

Plebe Rude – “Evolução” – Trabalho de estofo da banda brasiliense que procura desvendar o caráter brasileiro por meio de um passeio por alguns dos principais fatos históricos dos 522 anos de existência política de nosso país. Dividido em duas partes, sendo que a primeira foi lançada em 2019, evidencia a habilidade de Philippe Seabra, o guitarrista e vocalista principal, como letrista e roteirista sonoro, digamos assim. O viés crítico está mais forte do que nunca, com fina ironia e sarcasmo quando da conexão com os tempos atuais.